Poético e belo, o filme disponível na Netflix conta a história de um Ulisses mexicano
Ulises, um garoto que vive no norte do México, em Monterrey, tem 17 anos e vai viver sua "Odisseia", uma longa viagem da qual voltará a pé, cansado, mas certo de que voltar é o seu destino.
Sua bela figura lembra os relevos dos antigos maias, donos daquela região há milênios. Roupas largas, de cores e estampas vibrantes, um corpo forte, não muito alto. Seu cabelo é sua maior originalidade. Raspado na nuca, eriçado no alto da cabeça com pontas coloridas de amarelo ouro, cai sobre a testa numa franja castanha e, dos lados duas mechas longas e largas, também coloridas nas pontas.
Quando ele dança a cumbia, formoso como um pássaro que bate as asas para voar, seu corpo todo se envolve em passos e gingados que encantam. Braços ao alto, usa os dedos para fazer a estrela que é o símbolo dos "Terkos", os obstinados, grupo ao qual pertence.
Ele é o melhor dançarino. A cumbia é a sua vida. São momentos em que mostra quem é, brilhando. Mas nada é fácil para ele, assim como para todos que vivem na periferia de Monterrey.
Mas esses garotos, com suas roupas originais, são jovens alegres que enfrentam a feiura e a pobreza desse lugar onde vivem, dançando e cantando. São travessos, briguentos mas não são marginais, não usam armas e não são violentos. Há alguma relação com o tráfico, coisa normal em Monterrey.
Mas Ulises vai sofrer ainda mais nos Estados Unidos. Se não fosse pela neta de um chinês, não sabemos o que seria dele. Ela se aproxima de Ulises e quer ajudar. Mas nenhum fala a língua do outro. Começam a se entender por um sentimento de Lin (Angelina Chen) que quer proteger o mexicano de olhos doces.
O sonho de Ulises é poder cantar no metrô e ganhar algum dinheiro. Mas americanos desconfiam daquele rapaz diferente. É insultado e perseguido.
Vemos Ulises afundando. O sonho transformou-se em pesadelo. Entra num torpor melancólico e é levado pela polícia. A imigração manda ele de volta para o México.
E a viagem desse Ulises termina com uma visão de pesadelo.
O filme dirigido por Fernando Frias com grande empatia por seus personagens, é sublime. Atuações naturais, já que todos não são atores, roteiro poético e contemporâneo do próprio diretor, que às vezes até confunde a cronologia dos acontecimentos. Porque o roteiro quer mesmo confundir, mostrar os contrastes, o preconceito com o diferente, a ambiguidade entre mexicanos e americanos quando se trata de drogas e armas.
A fotografia é espantosamente bela. Pinta quadros. A música é de uma tristeza envolvente.
Juan Daniel Garcia "Derek" é um talento raro para a dança e um ator expressivo. De pronto ficamos intrigados com ele, que conquista logo também nossa simpatia.
Nosso Ulises mexicano volta à sua terra, mas não tem uma Penélope o esperando...Vai cumprir o seu destino.
(O trailer está no meu blog www.eleonorarosset.com.br)