02-09-2025 SÃO PAULO - SP CIDADE - RETRATO/ VIDAL SERRANO NUNES/ REITOR DA PUCSP - Fotos do reitor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Professor Vidal Serrano Nunes | Imagem: Taba Benedicto/Estadão Foto: Taba Benedicto/ Estadão
PUC-SP diminui mensalidades e quer aproximar cursos do mercado, diz reitor

PUC-SP diminui mensalidades e quer aproximar cursos do mercado, diz reitor

Prestes a completar 80 anos em 2026, a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) reestrutura parte de seus cursos com mudanças nas grades curriculares. O objetivo de alinhar as disciplinas com demandas do mercado, como uso da inteligência artificial (IA) em cada área.

O movimento é uma estratégia para reverter a queda de alunos (recuo de 28% de ingressantes entre 2014 e 2023) e reposicionar a imagem da instituição.

A reestruturação também abre espaço para reduzir a mensalidade (entre 5,8% e 42%) de 13 das 33 graduações para ingressantes a partir do próximo vestibular, em 2026.

A maioria desses abatimentos gira em torno de R$ 600, mas há cursos com descontos maiores, como o de Engenharia Biomédica (desconto de R$ 1.873)

Já a reforma na graduação em Economia não apenas reduziu a mensalidade, mas também do tempo de conclusão do curso: de 4,5 para 4 anos.

Outros cursos passam por reformas para atender a determinações regulatórias, como Ciência de Dados e Inteligência Artificial e Pedagogia, que terão aumento na mensalidade, e Psicologia, cuja futura mensalidade ainda será definida.



A instituição criou a "Aliança PUC 80″, projeto que visa a ampliar o relacionamento com setores da sociedade e uma "ressignificação" do ensino e da pesquisa, segundo o reitor Vidal Serrano Jr, em entrevista ao Estadão.

As mensalidades mais baratas, conforme a PUC-SP, são fruto de uma organização com maior previsibilidade da grade curricular, o que permite definir com mais antecedência a grade de disciplinas e os professores responsáveis, de forma a otimizar o calendário.

"A imprevisibilidade encarece os cursos, faz com que haja oscilação na mensalidade", diz Serrano Jr, que está no cargo desde novembro e fica até 2028.

A PUC-SP também promoveu uma pesquisa em que mais de 700 alunos e 200 professores foram ouvidos. Entre as demandas dos estudantes, estão tornar a universidade menos centrada nela mesma e mais envolvida com o mercado de trabalho.

RETRATO/ VIDAL SERRANO NUNES/ REITOR DA PUCSP. Foto: Taba Benedicto/ Estadão
Uma das mais tradicionais faculdades paulistanas, PUC-SP completa 80 anos em 2026 Foto: Taba Benedicto/Estadão

A reforma inclui ainda ampliar a interdisciplinaridade e ações conjuntas entre graduações, inclusive em projetos de pesquisa, além de ampliar atividades práticas em laboratórios e maior flexibilidade nas disciplinas de orientação de trabalho de conclusão de curso (TCC).

Leia os principais trechos da entrevista com o reitor da PUC-SP, Vidal Serrano Jr, e participação da a pró-reitora de Planejamento e Avaliação Acadêmicos, Mônica Carvalho:

Quais reformas estão sendo promovidas na PUC-SP?
Reitor: Na graduação, há três aspectos importantes. Primeiro: a base doutrinária. Dificilmente terá um bom profissional se não tiver sólida formação doutrinária, estudar os clássicos. Segundo: a questão da equipe. Inteligência emocional é importante. Faz parte de um bom curso, além da base doutrinária, ensinar essa adaptabilidade. O terceiro ponto é incluir matérias de aplicação prática.

A PUC tem solidez grande na formação do aluno do ponto de vista teórico e uma dinâmica de trabalho em time consolidada. O que faltava são matérias de interesse do mercado naquela respectiva área e a introdução da inteligência artificial.

De que forma, exatamente, essa aproximação com o mercado foi implementada?
Reitor: Fazendo pesquisa em alguns dos nossos cursos, constatamos qualidade boa - excelente em alguns casos -, mas que se ressente de aproximação maior com dinâmica atual do mercado. Pensamos em fazer essa aproximação e passamos, a partir disso, a promover reformas. Cursos que foram reformados são, por exemplo, os de Administração de Empresas, Economia e Ciências Sociais. Em todos eles, uma lógica parecida: primeiro introduzir matérias novas com inteligência artificial, que já havia em outros cursos, mas agora virou diretriz, com noção genérica de inteligência artificial; e depois a inteligência artificial aplicada às áreas específicas.

Quais são os desafios de lidar com a IA no âmbito acadêmico? Ao mesmo tempo que se estuda a inteligência artificial, há controvérsias sobre seu uso para tarefas acadêmicas.
Reitor: Existe uma espécie de ambiguidade intrínseca. De um lado, a preocupação de que os estudantes não usem a inteligência artificial em substituição a leituras, a atividades acadêmicas, porque o escopo da graduação é a formação do aluno. Ele tem de aprender a raciocinar, a seguir os parâmetros principiológicos daquela ciência na qual está se iniciando. Ao mesmo tempo, dificilmente ele consegue posto no mercado de trabalho daqui a alguns anos se não tiver iniciado na utilização de inteligência artificial. Temos esse cuidado: de um lado, continuar na questão da formação, que é incentivar a construção de raciocínios a partir de leituras e reflexões e, de outro, mergulhar o aluno na utilização da inteligência artificial na sua respectiva área.

A PUC-SP têm ou planeja criar uma política de uso ético da IA para evitar, por exemplo, dependência extrema da tecnologia por parte dos alunos, falta de criticidade ou plágio?
Reitor: Sem dúvida. Já tem, inclusive, uma comissão montada.

Por que a PUC-SP decidiu reduzir as mensalidades dos alunos? Todos os cursos terão redução?
Reitor: Imediatamente, não são todos: 13 cursos terão uma diminuição de mensalidade. Houve ganho de eficiência. Por exemplo, temos dois cursos de Letras, o Bacharelado e a Licenciatura. Elas têm algumas aulas comuns, que antes eram dadas separadas e agora serão ofertadas com as turmas juntas. Com isso, os cursos passam a ter mensalidade de R$ 1,8 mil (antes eram de R$ 2.898 e R$ 2.779, respectivamente), e ficamos mais próximos da realidade de quem estudar nessa matéria. Vários cursos tiveram diminuição, alguns de maneira significativa. O de Administração de Empresas baixou o preço (de R$ 3.884 para R$ 3.450) porque melhorou muito o currículo, mudamos matérias, substituímos por matérias de menor duração. Para as novas gerações, uma aula de quatro horas de orientação de TCC já não faz mais sentido. Substituímos por matérias mais eficientes, objetivas e dinâmicas. Isso veio de um trabalho de escuta ativa dos estudantes.

De onde esses valores serão retirados?
Pró-reitora: Quando assumimos (em novembro de 2024), a primeira prioridade era requalificar os cursos de graduação, modernizá-los. Precisa introduzir temas e instrumentos de pesquisa mais contemporâneos, independentemente do que isso seria traduzido ou não no valor dos cursos. Ninguém fez uma reforma curricular, pensando na redução dos cursos, mas pensando na qualidade. Acontece que anteriormente tínhamos uma série de imprevisibilidades nos cursos: não sabíamos qual departamento ia dar aquela disciplina, como seria encaminhada. Havia uma forma de gestão que impedia previsibilidade, então criava uma dificuldade para a projeção do valor da mensalidade, que tendia a ser uma projeção voltada para cima. A imprevisibilidade encarece os cursos, faz com que haja oscilação na mensalidade. Quando melhoramos o nosso curso, criamos a previsibilidade. Agora, todo semestre tem a grade horária cheia, com disciplinas de segunda a sexta. Sabemos exatamente o que vai acontecer em cada uma dessas disciplinas, quais os departamentos responsáveis por ela. (A partir de agora), o estudante sabe exatamente a mensalidade que vai pagar durante os quatro anos, com exceção dos reajustes. Mas também (houve) um processo de negociação assumido aqui pela reitoria (com a Fundasp para reduzir mensalidades).

Essa redução ocorre em cenário de maior competitividade no mercado de ensino superior: mais faculdades de ponta que competem pelo público da PUC-SP. De outro lado, há cursos a distância com preços mais baixos, que podem atrair o público que seria bolsista na PUC.
Reitor: Sim, há concorrência muito maior hoje, e de duas formas diferentes. Um deles (ocorre) entre pessoas que não olham exatamente para o valor do curso, um segmento que já no ensino médio paga mais do que qualquer mensalidade aqui, e o desafio é oferecer um curso melhor que o da concorrência para alguns cursos tradicionais nossos, como Direito e Medicina. Para grande parte desses alunos, preço não é pauta, a pauta é qualidade, ranqueamento, produção, quantidade de aprovações na OAB, por exemplo.

De outro lado, em alguns cursos de menor procura e nos cursos noturnos o estudante interessado discute duas coisas, além da qualidade: a acessibilidade e preço. Se um curso é o melhor, mas tem preço que não posso pagar, 'vou fazer o perto da minha casa, que é pior e mais barato'. Além da diminuição das mensalidades, enquanto o metrô (Linha 6-Laranja) não fica pronto, vamos colocar um ônibus à noite para levar os alunos até a estação mais próxima, na Barra Funda.

A queda do número de ingressantes na PUC-SP também entra nessa conta?
Reitor: Houve diminuição na procura nos últimos anos. Nesse vestibular de inverno (para ingresso no 2º semestre), conseguimos reverter um pouco. Já houve aumento em relação ao vestibular de inverno de 2024. E a nossa expectativa é que haja também agora no vestibular de verão. Mas é uma coisa que tem de ser trabalhada, não é para todos os cursos. Por exemplo, nosso curso de Direito é cada vez mais procurado.

Licenciaturas estão entre os cursos com queda de procura significativa na PUC-SP. O crescimento do EAD no mercado de educação superior, que têm preços bem mais baixos, pressiona a universidade?
Reitor: É um desafio que temos aqui, muito pelo EAD e também pela pouca valorização do docente hoje. Não sei se não há mais interesse dos alunos, mas a formação de professores é uma missão da universidade. Estamos trabalhando para baixar as mensalidades e tornar os cursos mais atraentes aos interessados, para fazer a licenciatura mais eficiente e acessível. Antigamente, eram só a USP e a PUC (que concorriam nas Licenciaturas). Hoje temos as federais, e essas entidades que oferecem curso EAD, que não é o ideal, não é um bom ensino, mas é o que o aluno pode.

Como estão as contas da PUC-SP, após um período de crise financeira?
Reitor: Quem gere a questão financeira da universidade é a mantenedora, a Fundação São Paulo (Fundasp). O que sei é que a PUC hoje está equilibrada, economicamente falando. Aquela crise que houve há 20 anos atrás foi superada.

RETRATO/ VIDAL SERRANO NUNES/ REITOR DA PUCSP. Foto: Taba Benedicto/ Estadão
02-09-2025 SÃO PAULO - SP CIDADE - PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA/ PUC/ CAMPUS SÃO PAULO - Campus da Pontifícia Universidade Católica na zona oeste de São Paulo. Foto: Taba Benedicto/Estadão Foto: Taba Benedicto/ Estadão

Como foi o trabalho de escuta ativa dos estudantes mencionado pelo senhor?
Reitor: É uma reunião de uma hora para os alunos de cada curso. Nos dez primeiros minutos, os alunos indicam o que os incomoda no curso, o que acham que precisamos modificar. Não tem pauta pré-definida pela reitoria, o estudante faz a pauta. Com base nessas indicações, fazemos a pauta. Em seguida, passamos a discutir cada um dos temas levantados. Isso nos permitiu, na verdade, uma identificação de problemas. A partir desses problemas, fizemos uma análise de como é que universidades nacionais e estrangeiras se comportavam a respeito do tema e passamos a implementar modificações.

Quais as principais pautas que surgiram de demanda dos estudantes?
Reitor: Depende um pouco da área, mas a demanda principal foi de que a PUC tem uma sólida formação, mas precisa de algumas matérias mais relacionadas com o mercado de trabalho. A (demanda por disciplinas ensinando o uso da) IA veio disso. Apareceu também a otimização da grade horária, quer dizer, pegar a grade horária e trabalhar com mais temas, (trocar) uma matéria dada em quatro horas para duas matérias de duas horas, acrescentando uma disciplina.

Os estudantes fizeram uma paralisação no 1º semestre do ano com demandas. A questão da mensalidade foi abordada. E as demandas sobre estrutura, bolsas de permanência e casos de racismo e assédio?
Reitor: É importante entender que existe uma questão de racismo estrutural, mas tenho a impressão que você encontra racismo em todos os locais. A PUC tem um histórico de luta antirracista. Mas há casos. Estamos fazendo cursos de letramento racial para estudantes, funcionários, professores etc. Haverá casos? Haverá. Só que aqui deve ser o lugar onde menos racismo há, quer dizer, em relação a outras universidades. É que aqui, como você tem um espaço de liberdade, as questões chegam e são discutidas. E estamos na frente, tentando discutir e avançar mais.

Mas existe uma demanda dos alunos por parte de uma diversidade maior tanto do corpo docente, com mais professores negros, quanto do corpo estudantil.
Reitor: Temos cota racial para estudantes na pós-graduação e para docentes, tem vários docentes negros que foram contratados. Esse é um tema que também somos pioneiros. Acho que a primeira universidade privada que adotou as cotas para docentes fomos nós. A PUC foi a primeira universidade brasileira que aprovou as diretrizes contra a discriminação de gênero e raça de Harvard. A segunda do mundo foi a nossa. Agora já tem várias outras universidades que aderiram. (Na graduação, 30% das bolsas concedidas pela Fundasp são destinadas a estudantes negros, pardos e indígenas de baixa renda).

Também estamos lançando um programa de acolhimento, uma novidade dessa reitoria. Esse programa organiza um fluxo como essas queixas andam na universidade e, dentro dele, tem um núcleo de mediação de justiça restaurativa. Quando há um problema dessa natureza, a questão não é só sancionatória, é educacional também. Buscamos estabelecer procedimentos que restaurem a boa relação e a boa acomodação das coisas. Se houver necessidade de punição, existe também a preocupação com o aspecto educacional. Por exemplo, uma punição, às vezes pode não ser uma suspensão, mas se o aluno for do Direito, por exemplo, tem de frequentar um núcleo de enfrentamento à intolerância racial, que foi exatamente o que aconteceu com o grupo envolvido no caso dos Jogos Jurídicos (em que alunos da PUC-SP chamaram estudantes da USP de "pobres" e "cotistas"). Eles foram suspensos, mas também terão de fazer aula de Direitos Humanos, ter que ir na Clínica de Direito de Enfrentamento e Intolerância Racial.

E qual foi o desfecho do caso de xenofobia, quando escreveram "a PUC não é para árabes" no banheiro da universidade, e de apologia ao nazismo, com o desenho de uma suástica na lousa de uma sala?
Reitor: Investigamos. (No caso da frase xenofóbica), não teve como apurar quem foi o autor. Tinha ali uma movimentação no corredor (do banheiro), mas nada indicou quem era ou o porquê. Também não conseguimos descobrir quem foi (que desenhou a suástica). Está sendo apurado pela autoridade policial, mas é difícil identificar quem foi.

Chefe de gabinete: Neste câmpus, passam 20 mil pessoas por dia. É como um banheiro público, vai ter (esse tipo de manifestação). Isso tem de ser enfrentado com seriedade, ser comunicado para toda a comunidade de que todos os casos serão apurados até o limite. Mas o fato é que uma inscrição numa lousa não pode ser significativa da comunidade, a PUC é uma comunidade plural, diversa, acolhedora.

RETRATO/ VIDAL SERRANO NUNES/ REITOR DA PUCSP. Foto: Taba Benedicto/ Estadão
PUC-SP tem 33 cursos e quer ampliar sua inserção com novidades da IA e do mercado de trabalho Foto: Taba Benedicto/ Estadão

A PUC-SP está com uma nova política para pesquisa?
Reitor: A política de pesquisa no Brasil, de maneira geral, é avaliada fundamentalmente com base na produção individual dos docentes. Montamos aqui um escritório de pesquisa cuja ideia fundamental é articular pesquisas de maior fôlego, que envolvam mais de uma área, mais de um docente, e pesquisas com repercussão social significativa. Precisamos ampliar e buscar também as pesquisas que sejam multidisciplinares, porque hoje as pesquisas aqui acabam centradas nos respectivos cursos. Queremos articular esses vários cursos em torno de pesquisas de maior profundidade, com interesse social maior. A questão climática, por exemplo, e o impacto social, jurídico, econômico.

Estadão
https://www.estadao.com.br/educacao/puc-sp-reduz-mensalidades-de-13-cursos-e-quer-renovar-imagem-mais-proximos-do-mercado/