Wesley Gonsalves
O Jockey Club de São Paulo voltou a despertar a atenção de incorporadoras, construtoras e fundos imobiliários interessados no seu terreno de mais de 600 mil metros quadrados.
O interesse pela área já é antigo, mas foi reacendido semana passada depois que o Tribunal de Justiça de São Paulo deu início ao julgamento de um pedido de recuperação judicial feito pela gestão do hipódromo, que opera em um modelo associativo, como o de um clube social.
Como o Jockey está atolado em dívidas, uma recuperação judicial abriria espaço para os terrenos serem vendidos sem que os compradores herdem também os passivos.
"Ninguém quer investir em um negócio que já começa com mais de meio bilhão em dívida," disse o sócio de um escritório de advocacia que acompanha o julgamento a pedido de dois clientes.
Prestes a completar 150 anos em 2025, o Jockey já não tem o mesmo prestígio de antes.
Depois de alcançar 9 mil sócios no seu auge, conta hoje com pouco mais de 300 - uma queda que acompanha o desinteresse dos paulistanos pelo turfe, uma modalidade que não conseguiu manter a popularidade que tinha no início do século passado, quando ocupava mais espaço nas páginas esportivas do que o futebol.
O local também perdeu espaço como destino de shows depois que os estádios se consolidaram como palcos para grandes artistas e festivais.
Em mais um sinal do momento crítico que vive o Jockey de São Paulo, sua unidade de Campinas entrou em leilão por causa das dívidas. O ativo está avaliado em mais de R$ 170 milhões e tem metade da área do hipódromo da capital.
O que resta ao Jockey de São Paulo é sua privilegiada localização na Marginal Pinheiros, que hoje serve de vista para parte dos prédios corporativos do Itaim Bibi e ainda atrai alguma receita com eventos empresariais e casamentos.
E é o que atrai também o interesse das incorporadoras, uma vez que os bairros nobres do entorno sofrem com escassez de áreas para verticalização.
A intenção da gestão do Jockey, porém, não é se desfazer de tudo, até porque os sócios ainda querem preservar as edificações tombadas e alguma pista para que as corridas continuem, uma fonte disse ao Metro Quadrado.
Mas é possível que nada disso ocorra porque a lei que regula os processos de recuperação judicial prevê que entidades e outros órgãos de economia mista não são elegíveis ao mecanismo legal da RJ.
O próprio relator do pedido, o desembargador João Batista de Mello Paula Lima, reforçou essa tese em seu parecer, ao lembrar que associações civis não teriam legitimidade para pedir RJ.
Depois do seu voto na quarta-feira, a sessão foi pausada com o pedido de vista de um dos desembargadores, Tasso Duarte de Melo.
Entre aqueles que aguardam a retomada do julgamento está a Prefeitura de São Paulo, já que parte das dívidas do Jockey envolve débitos de IPTU e ISS, que fontes avaliam como "impagáveis".
O Prefeito Ricardo Nunes já afirmou que irá à Justiça cobrar os débitos. Porém, nos bastidores, há quem diga que a Prefeitura também é favorável à recuperação judicial, "abrindo mão" dos valores devidos diante do potencial de arrecadação com empreendimentos imobiliários.
A área do hipódromo hoje é considerada uma Zona Especial de Preservação Ambiental (Zepam), segundo a atual Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo.
Assim, as edificações no local estariam limitadas a um gabarito de 10 metros, segundo a Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL).
O conjunto do Jockey também foi tombado pelo CONDEPHAAT, do governo estadual, e pelo CONPRESP, da Prefeitura de São Paulo, o que dificultaria a discussão, mas não a impediria.
O mercado imobiliário, além disso, já sabe que enfrentará resistência das associações de moradores de bairros como Morumbi, Jardim Paulistano e Jardim Europa, vizinhos ao terreno.
A estratégia das incorporadoras é avançar em bloco. Em vez de apenas uma demonstrar interesse por 100% do terreno, no evento de uma RJ vários players entrariam na briga por pedaços menores, aumentando a pressão pela verticalização e a chance de superar conflitos judiciais e urbanísticos.
Caso a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial decida pela inviabilidade da RJ, a expectativa é de que o caso seja submetido ao Superior Tribunal de Justiça.
Em decisões anteriores, o STJ já chancelou casos parecidos, que fogem ao escopo tradicional da lei, decidindo favoravelmente em prol das recuperações judiciais de entidades.
A disputa pelo terreno do Jockey está apenas no começo - e pode levar anos para ser concluída.
Metro Quadrado
https://metroquadrado.com/cidades/jockey-flerta-com-rj-e-reacende-interesse-pelo-seu-terreno/