Supla prepara lançamento de álbum com a banda Punks de Boutique Foto: Tiago Queiroz/Estadão |
Supla fala sobre chegada à 3ª idade, pais políticos e o que significa ser punk hoje

Supla fala sobre chegada à 3ª idade, pais políticos e o que significa ser punk hoje

Às vésperas do 'Dia do Rock', o cantor de 59 anos reflete sobre o cenário atual do gênero, discute novo álbum com o Punks de Boutique, show no The Town e ser filho de Eduardo e Marta Suplicy


Por Gabriel Zorzetto

Às vésperas do Dia do Rock, celebrado em 13 de julho, a presença do paulistano Supla na sede do Estadão é mais do que apropriada.

O 'Papito' não abandona o estilo punk. Exibindo seus cabelos louros espetados, blazer com estampa de leopardo e óculos escuros, ele chama a atenção aonde passa. Também continua distinto na hora de falar, com sua linguagem própria, impregnada por expressões e gírias norte-americanas.

Minutos antes da entrevista começar, em um raro momento no qual sua contagiante animação foi suplantada por tristeza, Supla expôs fragilidade ao lembrar com pesar da morte de duas ex-namoradas: Monica Watson, que inspirou um dos seu principais hits, Green Hair (Japa Girl), e Victoria Wells, com quem teve parcerias musicais recentes. "Sou duas vezes viúvo de namoradas", disse ele, em tom de incredulidade.

Mas a vida continua para o cantor de 59 anos, que prepara o lançamento de um álbum com a banda Punks de Boutique para o fim de julho. O disco, cujo título ainda será revelado, vem impulsionado por uma série de singles já lançados, como Livre e If You Believe in Nosferatu, responsáveis por antecipar uma performance especial do artista no festival The Town, em setembro, ao lado do grupo Inocentes.

Nesta conversa, o músico discutiu o momento atual da carreira, o cenário atual do rock e falou sobre sua relação com algumas lendas do gênero, como Billy Idol e Glen Matlock (baixista do Sex Pistols), além de relembrar sua convivência com Cazuza, cuja morte acaba de completar 35 anos. Também valorizou a figura de Elvis Presley, ícone que ele teve a chance de interpretar na série Raul Seixas: Eu Sou (disponível no Globoplay).

Oriundo de uma família tradicional e abastada, Eduardo Suplicy também confessou já ter contestado os pais, Eduardo e Marta Suplicy - de quem ele reconhece ter adquirido uma consciência social -, e rebateu aos ataques que sofre por ser filho dos políticos ligados ao Partido dos Trabalhadores (PT).

Por motivos de compreensão, clareza e espaço, o conteúdo da conversa abaixo foi editado e condensado.

TQ SÃO PAULO 16.05.2023 CADERNO2 Coletiva de imprensa da virada cultural com a presença do prefeito Ricardo Nunes, secretários e artistas que participarão, como o roqueiro Supla. FOTO TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO. Foto: Tiago Queiroz/Estadão
Supla prepara lançamento de álbum com a banda Punks de Boutique Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Em seu novo single, 'Livre', você canta que está livre e leve. Por quê?

Foi a primeira canção que eu fiz com todos os integrantes dos Punks de Boutique, que é a banda que já me acompanha há uns três anos. Todo mundo colocou um pedaço da letra. É o sentimento de seguir em frente e estar livre pra viver várias coisas. Essa música vai estar no meu novo álbum, no qual tive a oportunidade de gravar com uma banda que me acompanha em Los Angeles, quando eu estou por lá, incluindo o Marc Orrell, guitarrista que tocou no Dropkick Murphys.


O que significa 'Punk de Boutique'?

Quando comecei a minha carreira e fiquei famoso no Brasil, com 18 anos, o pessoal gostava de falar de forma depreciativa que eu era 'punk de boutique'. Quis chamar a banda assim porque você tem que ter estilo para ser um 'punk de boutique', tem que ter culhão também. Me lembro do New York Dolls, por exemplo, chamavam eles de 'bando de bichas', mas as meninas estavam lá com eles o tempo todo (risos).

No palco, você é um performer nato. Como tem sido se apresentar nos grandes festivais?

Quando você está no The Town, Rock in Rio, Lollapalooza, é uma visibilidade muito grande. Dessa vez, fui convidado para dividir o palco com o Inocentes no The Town. Conheço o Clemente [fundador do Inocentes], vamos fazer uma junção e já temos a ideia organizada, mas não vou adiantar, para não perder a surpresa.

O cantor Supla é dono do hit 'Green Hair (Japa Girl)'
O cantor Supla é dono do hit 'Green Hair (Japa Girl)' Foto: Denise Andrade/Estadão

Você interpretou Elvis Presley na nova série do Raul Seixas. Como isso aconteceu?

O pessoal da produtora O2 me convidou. O Raul tinha três personagens imaginários que ele meio conversava: Jesus Cristo, Dom Quixote e Elvis. Então, eu estudei bem o Elvis, tinha que fazer uma cena rápida e foi bem legal. Tem a famosa frase do John Lennon: 'antes do Elvis não tinha nada'. Ele foi muito importante para o Raul. Também vou interpretar um caçador de vampiros na série Wander.

Falando um pouco sobre o cenário do rock. Vemos uma nostalgia muito forte com a volta do Oasis, a despedida do Black Sabbath. Quando tudo isso acabar, o rock vai virar peça de museu?

São outras épocas. Achei linda a apresentação do Steven Tyler na despedida do Sabbath. Daqui a pouco não vamos mais ter essas bandas clássicas, mas eu acho que vão aparecer novos talentos, novos ídolos. Mas será de outra forma, porque é uma outra geração.

Desses grandes nomes do rock, o Billy Idol é uma referência clara para você...

Sim, quando eu o encontrei aqui em São Paulo [em 2022], eu liguei na frente dele para um conhecido nosso, que incentivou ele cantar e ir para o Generation X. Temos uma relação de respeito. Ele sentiu o amor que tenho pelo rock n' roll, que não é fake. Temos amigos em comum, como Glen Matlock, que tocou com o Brothers of Brazil [banda que formou com seu irmão João Suplicy] no Rock in Rio e fez uma música comigo chamada This Ain't the Ballad of Johnny Stiff.

Também está fazendo 35 anos da morte do Cazuza. Como era a sua relação com ele?

Conheci o Cazuza no Barão Vermelho, na época das danceterias. Ele foi muito educado comigo. Sempre foi um cara dócil. Eu nunca encontrei ele muito louco [no sentido de estar sob efeito de álcool ou drogas]. Nós dois somos arianos. Geralmente os arianos se entendem. E tínhamos essa identificação, talvez da classe média alta, de uma certa forma. E aí fizemos uma letra juntos, Nem Tudo é Verdade, que depois eu musiquei e lancei.

O que é e como é ser punk em 2025?

Eu acho que punk é uma atitude. É você não seguir as regras, não seguir a moda. Não adianta você ter o cabelinho punk ou jaquetinha punk. Tem que estar na sua essência. Cada um se expressa como pode. É um estilo de vida. Eu estou fazendo isso até hoje. Comecei com 13, 14 anos, tocando na noite de São Paulo. Eu tocava Beatles e Rolling Stones. Ser punk é tentar se manter o mais honesto possível dentro de uma indústria que sempre foi meio corrupta.

Supla ao lado dos pais, os políticos Marta Suplicy e Eduardo Suplicy. Foto: Sergio Castro/Estadão
Supla ao lado dos pais, os políticos Marta Suplicy e Eduardo Suplicy Foto: Sergio Castro/Estadão

Mas se voltarmos para o fim dos anos 1970, quando o punk começou na Inglaterra, era uma coisa anti-establishment, anti-sistema. Ao mesmo tempo, os seus pais são o establishment, se me permite dizer. São políticos tradicionais, descendentes de famílias abastadas: os Matarazzos e os Barões de Vasconcelos. Então, a sua identidade punk é uma resposta contra a sua família?

Meu pai sempre sofreu um grande preconceito. Às vezes até da esquerda. Falavam: 'como pode um Matarazzo estar fundando o Partido dos Trabalhadores? Você está louco, você é um traidor!'. Mas isso está acima do político. É a coisa humana, de se sensibilizar com as pessoas que não tiveram nenhuma oportunidade. Ou você pode cagar, só pensar em ganhar dinheiro. Mas essa não foi a pegada do meu pai. Fui influenciado por isso, mas nunca virei político. Eu sempre corri, fiz o meu caminho.

Não te atormentam muito por você ser filho de políticos ligados ao PT?

Os caras falam de Lei Rouanet (risos), mas eu nunca [usei]... Minha mãe foi Ministra da Cultura, Ministra do Turismo. Uma vez me convidaram pra fazer alguns shows fora do Brasil durante a Copa do Mundo de 2014, mas eu não aceitei, para evitar que falassem qualquer coisa. Isso incomoda, mas estou pensando mais no aspecto grande da coisa do que nesses blá-blá-blás. Você está me xingando? Vai lá, faça melhor e não enche o meu saco. Cala a boca e faça o seu trabalho. Essa coisa de esquerda e direita é uma tristeza.

Supla em apresentação no Palco Sunset do Rock in Rio de 2017
Supla em apresentação no Palco Sunset do Rock in Rio de 2017 Foto: Wilton Junior/Estadão

No ano que vem você irá completar 60 anos. Como se sente chegando à 3ª idade?

Ah pare, eu não acredito! Me mantenho bem fisicamente e sempre criativo, trabalhando a mente. Mick Jagger é o maior showman de todos os tempos. Ele está com mais de 80 anos. É uma inspiração para continuar. Uma vez eu fui no programa do Danilo Gentili e ele falou: 'pô, você já está velho e fica usando essas roupas'... Eu fui isso a vida inteira, vou mudar agora?

Estadão
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