O viver e a felicidade, por João Antonio da Silva Filho

O viver e a felicidade, por João Antonio da Silva Filho

''Sonhar é construir expectativas, e expectativas são o cerne da motivação para viver. Como bem pontuou Gilles Deleuze em Diferença e Repetição, a vida é um jogo constante entre o que se repete e o que é diferente. Contudo, para compreender essas nuances, é essencial desenvolver conceitos precisos sobre o que vivemos. Sem clareza conceitual, não reconhecemos nem as variações nem os padrões que definem a existência.''


Por João Antonio da Silva Filho

Quando projetamos o futuro, encontramos um horizonte nebuloso, composto por expectativas de superação e ajustes às escolhas que não foram adequadas. A vida, nesse sentido, é um processo contínuo de revisão e reinvenção: corrigimos rotas, ajustamos planos e tentamos alinhar nossas ações a referenciais mais coerentes com nossos desejos. Viver é, portanto, um exercício constante de planejamento, decisões e enfrentamento das consequências que decorrem dessas escolhas.

Nos caminhos que traçamos, alternamos entre estradas largas e estreitas, entre trajetos claros e picadas que precisam ser abertas. Por vezes, tentamos eliminar curvas, na esperança de tornar a jornada menos imprevisível. No entanto, são justamente essas curvas que dão à vida o sabor do inesperado, desafiando-nos a encontrar sentido mesmo no incerto. Administramos sonhos como gestores de nosso próprio destino, porque, sem sonhos, a existência se torna vazia de propósito.

Sonhar é construir expectativas, e expectativas são o cerne da motivação para viver. Como bem pontuou Gilles Deleuze em Diferença e Repetição, a vida é um jogo constante entre o que se repete e o que é diferente. Contudo, para compreender essas nuances, é essencial desenvolver conceitos precisos sobre o que vivemos. Sem clareza conceitual, não reconhecemos nem as variações nem os padrões que definem a existência. Assim, viver é projetar novos horizontes, é manter-se em movimento criativo na busca de novas possibilidades.

A felicidade, por sua vez, é fugaz, um estado efêmero que não se sustenta de forma permanente. Encontramos alegria em momentos específicos: quando realizamos algo planejado, quando encurtamos caminhos que nos levam aos nossos objetivos, ou quando compartilhamos momentos com pessoas queridas. Mas a felicidade não se restringe à alegria; ela é mais profunda, ligada à capacidade de encontrar sentido e propósito mesmo nos desafios.

Viver é escolher continuamente os caminhos pelos quais desejamos trilhar. É alternar entre o esforço de subir ladeiras e o alívio de descer montanhas, entre trajetos retos e as curvas que nos fazem hesitar. A incerteza que essas curvas trazem pode ser fonte de medo, mas também de aprendizado. Afinal, a vida se revela mais rica e significativa justamente quando encaramos o desconhecido com coragem e abertura.

Buscar a felicidade, portanto, é encontrar nas expectativas e nos sonhos a motivação necessária para seguir adiante. É entender que a caminhada não é feita apenas de conquistas, mas também de pausas, reflexões e renovações. Ser feliz não é um estado permanente, mas um esforço contínuo de reinterpretar a vida, aprendendo a celebrar tanto as retas quanto as curvas que moldam nossa trajetória.



João Antonio da Silva Filho é mestre em Filosofia do Direito e doutor em Direito Público, com experiência em gestão pública e controle externo. Atualmente, é conselheiro do Tribunal de Contas do Município de São Paulo e vice-presidente da ATRICON (Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil). Ao longo de sua trajetória, atuou como vereador na cidade de São Paulo, deputado estadual e secretário de Articulação Política na gestão do prefeito Fernando Haddad. Autor de diversas obras, sua publicação mais recente é Estado, Democracia e Controle Externo das Contratações Públicas, consolidando sua expertise na interseção entre direito público e gestão democrática.

https://joaoantonio837.wordpress.com/2025/01/12/o-viver-e-a-felicidade/