Vendas disparam no Brasil com modelos que se tornaram objetos de desejo e status
Por Tiago Cordeiro
Nos primeiros dois meses do ano, um setor específico do varejo brasileiro registrou um salto no faturamento, com crescimento de 42% em relação ao mesmo período do ano anterior. Não foi o de moda nem o de calçados nem o de informática. Trata-se do segmento de relógios. Não foi um pico isolado: de 2020 para 2024, o faturamento anual com esses produtos cresceu de 950 milhões para 1,4 bilhão de reais. As vendas têm aumentado de forma consistente, ano após ano, para a surpresa até mesmo de executivos do setor, como relata Renato Balbi, presidente da rede de joalherias carioca Monte Carlo Joias, com cinquenta lojas pelo Brasil. "Nenhuma empresa do setor previu esse aumento. Nós mesmos fomos pegos de surpresa", afirma ele, que, ao longo de seus doze anos à frente da empresa, ouviu mais de uma vez que os relógios tradicionais iriam desaparecer diante das alternativas mais tecnológicas. "A morte dos relógios foi anunciada muitas vezes. E cá estamos, ampliando os espaços nas vitrines e expandindo a capacidade produtiva."
Desde o tempo de Napoleão
O que explica esse fenômeno? Na avaliação de Joaquim Ribeiro, presidente da fabricante de relógios Technos, aconteceu uma mudança no foco dos consumidores. Se antes a motivação mais comum era a funcionalidade, agora o foco está no relógio como um objeto aspiracional. "Uma parcela do mercado consome nossos produtos para compor o visual. Outra usa os modelos como símbolo de status. E ganhou força, recentemente, o segmento dos colecionadores entusiastas, interessados nos mecanismos e nos materiais utilizados", afirma Ribeiro. Só no último trimestre de 2024, a Technos experimentou um crescimento de 24% na receita líquida.

Resistentes: o fim dos relógios já foi anunciado muitas vezes, mas eles seguem no mercado (./Divulgação)
O apelo da tradição é, de fato, muito forte: acredita-se que o primeiro modelo de relógio de pulso date de 1814, quando Abraham Louis Breguet atendeu a uma encomenda da princesa Carolina Murat, irmã de Napoleão Bonaparte. O uso se popularizou ao longo do século XX graças ao impulso de diferentes personagens históricos - como o aviador Alberto Santos Dumont, que carregava com orgulho um relógio de pulso desenvolvido especialmente para ele pelo joalheiro Louis Cartier.

O crescimento dos relógios não reduz o impacto do mercado de smartwatches, que continua a ocupar um espaço sólido entre um perfil específico de consumidores. De acordo com a consultoria de mercado Nielsen IQ GfK, no ano passado, a receita dessa categoria cresceu 9%, com aumento de 37% no volume de vendas em relação a 2023. São produtos focados na tecnologia e na conectividade, com um apelo adicional ganhando corpo nos últimos anos: a possibilidade de utilizar os aparelhos para monitorar o bem-estar.
A marca coreana Samsung, por exemplo, vem apostando nos smartwatches como forma de acessar dados relevantes sobre a saúde, 24 horas por dia. "Nossos aparelhos são capazes de medir uma variedade de métricas de saúde, incluindo frequência cardíaca, níveis de oxigênio no sangue, qualidade do sono e até mesmo o VO2 max, o volume de oxigênio máximo, um indicador fundamental do condicionamento físico", afirma Rodrigo Rossi, gerente-sênior do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Samsung no Brasil.
Uma coisa é certa: seja na versão digital, seja na tradicional, os relógios continuam resistindo ao tempo e às previsões de que sua hora passou.
Publicado em VEJA, abril de 2025, edição VEJA Negócios nº 13
https://veja.abril.com.br/coluna/bem-viver/relogios-de-pulso-ganham-nova-geracao-de-fas-e-aquecem-o-varejo/#google_vignette