O BRB anunciou a compra de parcela do Master na sexta-feira passada, mas operação ainda precisa de aval do BC e Cade | Imagem: Rafael de Matos Carvalho/Adobe Stock
Compra do Master pelo BRB adapta cartilha do Proer, que salvou bancos há 30 anos; leia bastidores

Compra do Master pelo BRB adapta cartilha do Proer, que salvou bancos há 30 anos; leia bastidores

Estratégia é comprar ativos que seriam bons, segundo auditoria técnica do BRB, e deixar para trás pedaços do Banco Master vistos como mais arriscados


Por Alvaro Gribel

BRASÍLIA - O banco estatal de Brasília BRB está seguro de que fez uma auditoria técnica e embasada para fechar a operação de compra de 58% do capital total do Banco Master. Dentro da instituição, a operação é comparada ao Proer, programa oficial de socorro a bancos nos anos 90. Isso significa que o BRB vai incorporar os ativos do Master que têm valor, deixando para trás as operações consideradas problemáticas, que terão outro fim. Com esse desenho, na visão do BRB, um risco potencial para o sistema financeiro ficaria menor.

Parte importante do patrimônio do Banco Master é composto por precatórios (títulos de disputas judiciais contra governos), que são de recebimento incerto. O banco multiplicou por dez seu patrimônio e quintuplicou sua carteira de crédito desde 2021. Um dos motores desse crescimento foi a oferta de Certificados de Depósito Bancário (CDB) que pagam ao investidor taxas muito acima dos concorrentes, de até 140% do CDI.

Em 1995, o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer), foi lançado com a lógica de incentivar a fusão de bancos, juntando um banco com problema com outro saudável. O primeiro deles foi a incorporação do Nacional pelo Unibanco. Mas houve também a injeção de recursos públicos nas instituições por meio do Banco Central - R$ 16 bilhões em valores da época. O cenário que se desenha agora não passa por injeção de dinheiro do BC ou do governo federal, mas envolve o BRB, um banco que pertence ao Distrito Federal.

O que se comenta no mercado financeiro é que o Banco Master tem dois problemas em seu balanço. Tanto pelo lado dos passivos (aquilo que o banco se comprometeu a pagar, ou seja, as obrigações financeiras), quanto dos ativos (os bens e produtos financeiros que foram comprados com esse dinheiro, para receber rendimentos em troca).

Pelo lado dos passivos, foram vendidos muitos Certificados de Depósito Bancário (CDBs), que são uma espécie de dívida lançada por instituições financeiras, a um custo muito acima do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), taxa cobrada entre os bancos para emprestarem entre si, e que é atrelado à Selic). Como mostrou o Estadão em novembro, em alguns casos chegava a 140% do CDI, um valor muito acima do praticado pelo mercado.

Com isso, o Master conseguia captar recursos, principalmente de pessoas físicas, que são garantidos pelo Fundo Garantidor de Crédito em até R$ 250 mil. Esse foi o motor do crescimento acelerado do banco, por meio dessas captações. Segundo dados do Banco Central de junho, há R$ 45,6 bilhões desses passivos do banco rodando pelo mercado financeiro. O mercado aposta que o número ficará maior quando o banco divulgar o seu balanço consolidado de 2024.

Já pelo lado dos ativos do banco, os problemas estão principalmente em precatórios que o Master carrega, além de direitos creditórios, e participações e empresas que vinham apresentando problemas.

Conforme relatou em entrevista ao Estadão no último sábado, o presidente do banco, Paulo Roberto da Costa, afirmou que R$ 23 bilhões desse tipo de ativo não ficarão com o novo Banco Master que será incorporado ao BRB.

Em outras palavras, isso quer dizer que ficarão em braços do grupo que serão segregados, como o banco Voiter e o Master Par, que compra participações em empresas. Esse seria o grande problema do resultado da operação, e que poderia virar objetivo de socorro por parte do Fundo Garantidor de Créditos (FGC).

Nesse cenário mais extremo, o FGC teria que honrar os passivos junto a correntista, realizando os pagamentos em até um mês após a liquidação. Posteriormente uma análise do balanço patrimonial precisaria ser feito, para saber se aportes por parte de outros bancos seriam necessários. Esses aportes, no fim das contas, acaba encarecendo o custo do crédito do País, já que são repassadas para as tarifas cobradas dos consumidores.

Os precatórios são dívidas que o governo federal tem com pessoas físicas e jurídicas. É um ativo visto como sem liquidez, porque não se sabe exatamente quando o governo vai pagar, e em 2021 foi motivo de calote dado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que pedalou o pagamento dessa conta. Esse esqueleto, herdado do governo anterior, foi pago integralmente pelo governo Lula, mas por fora da regra do teto de gastos, com autorização do Supremo Tribunal Federal (STF).

O problema é que esse gasto "por fora" está autorizado somente até o ano que vem, e a partir de 2027 ele terá que voltar integralmente para o Orçamento. Há dúvidas se o governo federal vai conseguir cumprir com essa promessa, ou se alguma solução política será costurada nos bastidores. De toda forma, o precatório é visto como um ativo mais arriscado no mercado.

O BRB entende que está bem cercado juridicamente da operação, e lembra que o valor da compra pode diminuir, caso as diligências sobre o Master encontre problemas nos seus ativos. Além disso, conta com a análise do Banco Central, que precisa aprovar a operação antes da conclusão do negócio.

O que ainda permanece em aberto nessa operação, vista por muitos como de salvamento, é se realmente o BRB vai ganhar com sinergias no negócio, ou se houve influência política sobre o banco estatal, já que o presidente do Master, Daniel Vorcaro, é visto como pessoa com ótimo trânsito pelos corredores de Brasília.

O Estado de S.Paulo
https://www.estadao.com.br/economia/compra-do-master-pelo-brb-adapta-cartilha-do-proer-que-salvou-bancos-ha-30-anos-leia-bastidores/