Elza Soares na abertura da I Expo Internacional Dia da Consciência Negra | Imagem: Edson Lopes Jr. - Blog do Arcanjo
Elza Soares, 91 anos e 70 de carreira, morre gravando DVD e cantando

Elza Soares, 91 anos e 70 de carreira, morre gravando DVD e cantando



A cantora Elza Soares, que morreu quinta-feira, aos 91 anos de idade e 70 de carreira, foi enterrada ontem à tarde, dia 21, no Rio de Janeiro. Foram muitas as homenagens, que avançaram pelo velório realizado no Theatro Municipal e a ida para o Cemitério de Sulacap, na zona oeste do Rio. Ela morreu no mesmo dia em que, exatos 39 anos atrás, se foi o grande jogador Mané Garrincha, seu marido entre 1966 e 1982.


Elza Soares foi uma das maiores cantoras da Música Popular Brasileira, e que, até o dia anterior à sua morte, prosseguia no auge da carreira, gravando DVDs, ensaiando e cantando - o que ela mais gostava de fazer na vida. Em novembro último, ela veio a São Paulo especialmente para prestigiar a abertura da I Expo Internacional Dia da Consciência Negra, organizada pela Secretaria Municipal de Relações Internacionais, comandada pela secretária Marta Suplicy, com apoio da Prefeitura de SP.

A seguir, um texto de sua autoria:

"Um dia descobri que cantava. O meu filho mais velho, João Carlos, estava morrendo e eu já tinha perdido dois filhos e não queria perder mais um. Eu não tinha dinheiro pra cuidar do meu filho e ouvi no rádio que o programa do Ary Barroso de calouros Nota 5, estava com o prêmio acumulado. Não sei como, mas eu sabia que ia buscar o prêmio acumulado. Fiz a inscrição e me avisaram que eu precisava ir bonita. Mas eu não tinha roupas nem sapatos, não tinha nada! Então eu peguei uma roupa da minha mãe, que pesava 60 kg e vesti, só que eu pesava 32 kg, já viu né? Ajustei com alfinetes. Tudo bem que agora é moda né? Hoje até a Madonna usa, mas essa moda aí fui eu que comecei viu? Alfinetes na roupa é muito meu, é coisa de Elza!

No pé coloquei uma sandália que a gente chamava de "mamãe tô na merda", e fui!
Quando me chamaram, levantei e entrei no palco do auditório. O auditório tava lotado, todo mundo começou a rir alto debochando de mim.

Seu Ary me chamou e perguntou:

- O que você veio fazer aqui?
- Eu vim cantar!
- Me diz uma coisa, de que planeta você veio?
- Do mesmo planeta seu, Seu Ary.
- E qual é o meu planeta?
- PLANETA FOME!

Alí, todo mundo que estava rindo viu que a coisa era séria e sentaram bem quietinhos.
Cantei a música Lama.

O Gongo não soou e eu ganhei, levei o prêmio e meu filho está vivo até hoje, graças a Deus!
De lá para cá, sempre levo comigo um Alfinete.

Naquela época eu achava que se tivesse alimentos pros meus filhos, não teria mais fome. O tempo passou e eu continuei com fome. Fome de cultura, de dignidade, de educação, de igualdade e muito mais. Percebo que a fome só muda de cara, mas não tem fim.

Há sempre um vazio que a gente não consegue preencher e talvez seja essa mesma a razão da nossa existência".