O Banco Central, em Brasília - Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo |
BC mantém Selic em 15% e diz que manutenção por período 'bastante prolongado' é suficiente para alcançar meta de inflação

BC mantém Selic em 15% e diz que manutenção por período 'bastante prolongado' é suficiente para alcançar meta de inflação

O nível, que foi alcançado em junho, é o mais alto desde julho de 2006, no primeiro mandato de Lula


Por Thaís Barcellos - Brasília

Apesar dos apelos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o Banco Central (BC) seguiu o plano traçado em setembro e manteve a taxa Selic em 15% ao ano pela terceira vez consecutiva no Comitê de Política Monetária (Copom) desta quarta-feira. O nível, que foi alcançado em junho, é o mais alto desde julho de 2006, no primeiro mandato de Lula.

No comunicado, o BC tampouco alterou a sinalização de que os juros devem ser mantidos neste patamar por "período bastante prolongado", mas afirmou pela primeira vez que considera que o nível atual é suficiente para alcançar a meta de inflação de 3,0%.

Até o encontro anterior, em setembro, o Copom dizia que estava avaliando se o patamar de 15% seria suficiente para atingir a convergência inflacionária. Ou seja, a indicação é de maior confiança nos resultados da estratégia atual de política monetária, mas, ao mesmo tempo, o BC ainda não abre nenhuma porta para uma discussão sobre queda de juros.

Dessa forma, ganha ainda mais força a expectativa já majoritária entre economistas do mercado financeiro de que a autoridade monetária deve manter a Selic em 15% em dezembro, a última reunião do ano, e só iniciar os cortes em 2026, entre janeiro e março.

"O cenário atual, marcado por elevada incerteza, exige cautela na condução da política monetária. O Comitê avalia que a estratégia de manutenção do nível corrente da taxa de juros por período bastante prolongado é suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta. O Comitê enfatiza que seguirá vigilante, que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e que não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso julgue apropriado", disse o BC nesta quarta-feira.

Na avaliação sobre a evolução do cenário econômico desde o último Copom, o comitê reforçou que o quadro segue sendo marcado por expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho.

"Para assegurar a convergência da inflação à meta em ambiente de expectativas desancoradas, exige-se uma política monetária em patamar significativamente contracionista por período bastante prolongado", destacou o colegiado.

No comunicado, o BC também atualizou suas projeções oficiais para a inflação. No prazo em que o colegiado trabalha para colocar a inflação na meta, que agora é o segundo trimestre de 2027, a estimativa é de 3,3%. No Copom anterior, o foco era o primeiro trimestre de 2027 e a projeção era de 3,4%.

Para o fim de 2025, a estimativa caiu de 4,8% para 4,6%, ainda acima do teto da meta, que é de 4,50%. Para o término de 2026, a projeção foi mantida em 3,6%.

No Boletim Focus, que reúne as expectativas do mercado, as projeções também caíram desde o último Copom, mas, da mesma forma, continuam acima da meta em diferentes prazos. Para este ano, a estimativa saiu de 4,83% no último Copom e se aproxima do teto da meta de 4,50%, a 4,56%. Para 2026, a projeção caiu de 4,30% para 4,20%, enquanto, para 2027, a queda foi de 3,90% para 3,82%.

"As expectativas de inflação para 2025 e 2026 apuradas pela pesquisa Focus permanecem em valores acima da meta, situando-se em 4,5% e 4,2%, respectivamente."

O comunicado traz, porém, melhoras marginais nas considerações do Copom sobre a evolução do cenário. O comitê reconheceu "algum arrefecimento" da inflação cheia e das medidas subjacentes nas últimas leituras inflacionárias, mas ponderou que continuaram acima da meta.

Os últimos dados de inflação, como o IPCA-15 de setembro (0,48%), surpreenderam favoravelmente, inclusive em grupos de preços mais resistentes. Mas o índice acumulado em 12 meses segue fora da margem de tolerância da meta, que vai até 4,50%, e a inflação de serviços, por exemplo, permanece em nível bastante alto.

Em relação à atividade econômica no Brasil, o BC destacou que a " trajetória de moderação no crescimento da atividade econômica" ocorre conforme esperado pelo comitê. No comunicado desta quarta, porém, o colegiado trocou a expressão "certa moderação" por "trajetória de moderação". Por outro lado, manteve a avaliação que o mercado de trabalho "ainda mostra dinamismo".

Quanto ao cenário externo, o BC fez um comentário mais enxuto. Disse que o ambiente "ainda se mantém incerto em função da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos", mas retirou o trecho que fazia referência ao impacto no comportamento e na volatilidade de diferentes classes de ativos. Limitou-se a dizer, repetindo a frase da reunião de setembro, que o cenário incerto traz reflexos para as condições financeiras globais.

"Tal cenário exige particular cautela por parte de países emergentes em ambiente marcado por tensão geopolítica", reforçou também.

Desde setembro, houve evoluções nas tratativas comerciais entre Brasil e EUA, embora sem efeito prático no tarifaço imposto pelo governo americano à parte das exportações brasileiras. Lula conversou com o presidente dos EUA, Donald Trump, na Malásia e foi acordado uma retomada nas negociações.

"O Comitê segue acompanhando os anúncios referentes à imposição de tarifas comerciais pelos EUA ao Brasil, e como os desenvolvimentos da política fiscal doméstica impactam a política monetária e os ativos financeiros, reforçando a postura de cautela em cenário de maior incerteza", disse o BC, repetindo a frase do Copom de setembro.

Decisão

Era unânime no mercado financeiro a aposta de manutenção dos juros em 15% nesta quarta, segundo pesquisa do Valor Pro com 120 instituições. No encontro anterior, em setembro, o BC já havia indicado que sua estratégia era manter a Selic estável.

"O Comitê seguirá vigilante, avaliando se a manutenção do nível corrente da taxa de juros por período bastante prolongado é suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta. O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e que não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso julgue apropriado", disse o Copom, em setembro.

A postura dura do BC, mesmo com alguns sinais de moderação da inflação, tem aumentado as cobranças de integrantes do governo por uma redução de juros, inclusive Lula, responsável pela escolha de Gabriel Galípolo para presidência da autoridade monetária.

O chefe do Executivo disse recentemente que o BC "vai precisar começar a baixar os juros". O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi na mesma linha em evento nesta terça-feira em São Paulo.

- Eles vão ter que cair. Por mais pressão que os bancos façam sobre o Banco Central para não baixar juros, elas vão ter que cair. Não tem como sustentar 15% de juros reais com a inflação batendo 4,5% - disse. - Eu não sou diretor do Banco Central. Se eu fosse, votava pela queda.

O Copom, por sua vez, vinha repetindo o mantra de que é necessário "perseverança, firmeza e serenidade" para alcançar a convergência da inflação para a meta de 3,0%. Atualmente, o IPCA - índice oficial de inflação - está em 5,17% em 12 meses.

O Globo
https://oglobo.globo.com/economia/financas/noticia/2025/11/05/banco-central-segue-plano-e-mantem-selic-em-15percent-pela-terceira-vez-seguida-apesar-de-apelos-do-governo.ghtml