Declaração destoa de discurso nas eleições de 2024, quando prometeu cumprir quatro anos de mandato na prefeitura
Por Hyndara Freitas e Samuel Lima - São Paulo
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), afirmou nesta segunda-feira, 4, que poderia concorrer ao governo do estado caso recebesse um pedido de Tarcísio de Freitas (Republicanos), atual ocupante do cargo. A declaração destoa do discurso adotado pelo emedebista nas eleições municipais de 2024, quando garantiu que cumpriria os quatro anos de mandato, e ocorre em meio a movimentos do aliado político em direção ao pleito presidencial de 2026.
- Meu desejo é cumprir os quatro anos. Eu acho que ele não vai fazer isso, mas o que o Tarcísio me pedir eu não tenho como negar - disse o prefeito em entrevista à Globonews. Nunes acrescentou que tem "muita sintonia" com o governador de São Paulo e que tem "conseguido fazer muita coisa por conta dele", lembrando as cenas de esvaziamento da Cracolândia, com parte do fluxo de dependentes químicos migrando para outros locais da cidade.
Não é a primeira vez que o prefeito paulistano se posiciona na briga pelo posto de candidato de Tarcísio na hipótese de o governador decidir se candidatar a presidente em 2026 - algo que ainda depende de Jair Bolsonaro (PL), que alega querer ir às urnas mesmo declarado inelegível pela Justiça Eleitoral e sob ameaça de condenação no Supremo Tribunal Federal (STF), na ação penal que envolve uma trama golpista supostamente liderada pelo ex-presidente.
Em março deste ano, Nunes disse que mandato "não é um casamento" e que poderia ser levado a uma nova eleição no próximo ano. À época, alegou que tomaria uma atitude a depender do contexto político e tendo em vista o "projeto de derrotar a esquerda no nível nacional, estadual e municipal". O discurso foi lido com uma maneira de marcar território e levou outros políticos a confirmarem a intenção de angariar os espólios de Tarcísio, como Gilberto Kassab (PSD) e André do Prado (PL).
Kassab é secretário de governo e se cacifou para comandar o estado ao eleger mais de 889 prefeitos nas eleições municipais de 2024, a maior parte deles em São Paulo, por meio do PSD, sigla que fundou e preside atualmente. Trata-se de o maior número de vitórias no país entre todos os partidos. Prado, por sua vez, comandou a Assembleia Legislativa do Estado (Alesp) durante todo o mandato de Tarcísio e garantiu a aprovação de praticamente todos os projetos encaminhados.
Outro político cotado é o vice-governador Felício Ramuth (PSD), que ficaria à frente do Palácio dos Bandeirantes durante oito meses em razão da regra eleitoral que obriga Tarcísio a renunciar ao mandato em abril caso queira se candidatar a presidente em 2026. O secretário estadual de Segurança Pública, Guilherme Derrite (PP), em princípio concorrerá ao Senado, mas o presidente do partido, Ciro Nogueira, defende o seu nome a governador caso Tarcísio dispute a Presidência.
'Completo os quatro anos', disse Nunes nas eleições
Nunes assumiu a prefeitura em 2021, após a morte de Bruno Covas, prefeito que faleceu devido a um câncer no sistema digestivo. No ano passado, o ex-vereador da capital disputou pela primeira vez a prefeitura como cabeça de chapa. Com o apoio do governador Tarcísio de Freitas, ele derrotou o candidato do presidente Lula, Guilherme Boulos (PSOL), e conseguiu neutralizar a sua principal ameaça na direita, o empresário e influencer Pablo Marçal (PRTB).
O movimento contraria declarações dadas durante a campanha eleitoral e após a proclamação do resultado. No segundo turno contra Boulos, Nunes alegou inclusive que aquela poderia ser a sua eleição derradeira:
- Completo os quatro anos, depois chega - disse ele ao acompanhar o voto do vice-prefeito, o coronel da PM Ricardo Mello Araújo (PL), nome diretamente indicado para a chapa por Bolsonaro. Nunes foi taxativo ainda após o resultado.
Em entrevista exclusiva ao GLOBO, disse que não seria candidato mesmo com Tarcísio convocado para a disputa presidencial. "Não. Tem uma semana que eu fui eleito. Não tenho essa pretensão. Acho que eu preciso concluir os quatro anos para poder colocar em prática tudo aquilo que eu planejei."
A saída do cargo repetiria uma trajetória que se tornou comum nos últimos anos. Eleito em 2006, o prefeito José Serra abandonou a cadeira para concorrer ao governo do estado, contrariando promessa de campanha e deixando o posto para Kassab. O mesmo ocorreu com João Doria, eleito em 2016 e que, dois anos depois, fez o trampolim para o Bandeirantes, mesmo afirmando durante a campanha eleitoral que não faria isso.
O MDB faz parte da base aliada de Lula e comanda três ministérios em troca. O partido pleiteia, inclusive, o posto de vice na chapa de reeleição do petista, que poderia acabar com a ministra Simone Tebet (Planejamento) ou Helder Barbalho (governador do Pará), por exemplo. O presidente nacional da sigla, deputado Baleia Rossi, contudo, tem proximidade com Tarcísio, e uma ala defende fechar com o governador paulista e engrossar as trincheiras da oposição.
O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2025/07/14/nunes-diz-que-concorreria-ao-governo-de-sp-a-pedido-de-tarcisio-em-2026-nao-tenho-como-negar.ghtml