Lula estimula disputa entre Rui Costa e Fernando Haddad. | Imagem: Foto: Wilton Junior/Estadão
Ministro de Lula ganha apelido de 'Odorico Paraguaçu' e disputa protagonismo com Haddad; veja quem é

Ministro de Lula ganha apelido de 'Odorico Paraguaçu' e disputa protagonismo com Haddad; veja quem é

Rui Costa tem novo papel na equipe e faz road show para missões estratégicas, enquanto titular da Fazenda espera Congresso arquivar projeto da anistia e CPI do INSS para votar agenda econômica


Por Vera Rosa

O ministro da Casa Civil, Rui Costa, ganhou um novo papel no governo e, nos bastidores, disputa cada vez mais protagonismo com o titular da Fazenda, Fernando Haddad. A pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Costa passou a executar missões estratégicas, que vão além das tarefas da Casa Civil, e a fazer um "road show" internacional para atrair investimentos.

Na semana passada, por exemplo, o chefe da Casa Civil esteve em Pequim e Xangai para preparar a visita que Lula fará à China nas próximas segunda e terça-feiras, após a viagem a Moscou.

Costa teve reuniões com empresários do ramo de transportes e infraestrutura, apresentou o Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) aos chineses e integrará agora a comitiva de Lula ao país asiático. Como se fosse um embaixador, o ministro também tenta alinhavar acordos para a visita de Xi Jinping ao Brasil, em julho, quando haverá a reunião dos Brics.

Desde o início do terceiro mandato de Lula, Costa fez muitos desafetos na Esplanada dos Ministérios. Não sem motivo: segurou projetos apresentados por colegas, como a chamada PEC da Segurança - só recentemente enviada ao Congresso -, barrou contatos com Lula e deu memoráveis chás de cadeira naqueles que são chamados para reuniões.

Certa vez, cansado de esperar pelo chefe da Casa Civil para um encontro no Palácio do Planalto, Haddad não teve dúvida: se levantou e foi embora.

Ex-governador da Bahia, Costa chegou a receber na Esplanada o apelido de "Odorico Paraguaçu", prefeito de Sucupira, cidade imaginária do interior baiano. Cinquenta e dois anos depois, o impagável personagem interpretado por Paulo Gracindo na novela "O Bem Amado", de Dias Gomes, encarna até hoje a síntese da política no Brasil.

Nenhum dos dois ministros comenta a guerra de nervos estabelecida entre eles e Lula gosta de estimular a disputa, assim como fez, no seu primeiro mandato, com Antônio Palocci (Fazenda) e José Dirceu (Casa Civil).

Quando era presidente do PT, Gleisi Hoffmann atacava o que o partido batizou como "austericídio fiscal". Muitos previam que, no comando da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi se juntaria a Costa para reforçar o polo de poder contra Haddad no Planalto. Mas a ministra adota agora discurso cauteloso.

"As minhas críticas lá atrás eram sobre um determinado projeto, que foi o arcabouço e o déficit zero. Mas isso é página virada. Eu perdi esse debate e vamos tocar para frente", disse Gleisi à coluna. "Os resultados que nós temos na economia são muito positivos e acho que precisamos falar mais sobre eles", completou.

Tanto Rui Costa como Fernando Haddad têm o desejo de suceder Lula, ainda que seja somente na eleição de 2030. Até agora, porém, o presidente não construiu herdeiros políticos nem no PT nem em outros partidos nas fileiras da esquerda. Para 2026, o ministro da Casa Civil planeja se candidatar a senador pela Bahia; o titular da Fazenda, por sua vez, pode concorrer ao mesmo cargo por São Paulo.

Diante desse cenário nebuloso, Lula quer que os dois atuem como "mascates" para atrair investimentos ao Brasil, uma tarefa que, em tese, deveria ficar muito mais com o vice-presidente Geraldo Alckmin, também ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.

Haddad embarcou para os Estados Unidos logo depois de Costa retornar da China e hoje está no México. Na Califórnia, o ministro da Fazenda se reuniu com o secretário do Tesouro do governo Donald Trump, Scott Bessent.

As viagens dos dois homens fortes da gestão Lula ocorrem na esteira dos conflitos tarifários entre Estados Unidos e China e no momento em que o Brasil enfrenta grave crise com o escândalo do INSS.

Uma reforma ministerial não resolve o problema do presidente, que parece estar com o relógio atrasado e perdeu o "timing" das mudanças necessárias na equipe.

Enquanto isso, a agenda econômica de Haddad submerge no Congresso. A oposição a Lula só fala em anistia para golpistas e CPI do roubo dos aposentados.

Com dinheiro das emendas parlamentares no bolso e ministérios sob seu comando, o Centrão aproveita a descoordenação do governo para dar palanque aos adversários do Planalto. A estratégia lhe rende dividendos para construir candidaturas que vão enfrentar Lula, ou quem ele escolher, em 2026. Indo para os "finalmente", o Brasil parece mesmo uma grande Sucupira...

O Estado de S.Paulo
https://www.estadao.com.br/politica/vera-rosa/rui-costa-ganha-apelido-de-odorico-no-governo-lula-e-disputa-protagonismo-com-haddad/