Área da favela do Moinho, na região central de São Paulo; plano do estado é remover todas as família da área e transferi-las para imóveis regularizados | Imagem: Eduardo Knapp - 14.abr.25/Folhapress
União desautoriza demolições e pede moradia gratuita para famílias do Moinho, em SP

União desautoriza demolições e pede moradia gratuita para famílias do Moinho, em SP

Gestão Tarcísio rebate afirmando que local traz risco e que governo Lula pode ajudar a custear unidades para reassentar moradores da favela no centro de SP

Clayton Castelani

A SPU (Secretaria de Patrimônio da União) emitiu uma nota técnica desautorizando a demolição de habitações na favela do Moinho, na região central de São Paulo, até que a área seja definitivamente cedida ao estado. O documento assinado na última segunda-feira (14) pela chefia do órgão ligado ao governo Lula (PT) é uma resposta ao plano da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) de reassentar as cerca de 800 famílias que vivem no local.

Desfazer construções faz parte da estratégia do governo paulista para evitar a reocupação dos imóveis. O governo Tarcísio diz que o risco que a permanência representa aos moradores impõe a necessidade da retirada das habitações. Como o plano prevê que as mudanças ocorram aos poucos, as casas seriam desfeitas também progressivamente, tão logo fossem desocupadas.

O terreno localizado entre duas linhas de trens metropolitanos pertence ao governo federal, que vem discutindo com a gestão paulista a cessão gratuita da área, onde um parque deverá ser construído. Em troca, São Paulo propõe reassentar os moradores em apartamentos com financiamento subsidiado pela CDHU, a empresa estadual responsável por projetos de habitação popular.

Para ceder a área, a União faz uma série de exigências. Com o crescimento das manifestações contrárias à retirada de moradores, prevista para começar nos próximos dias, o órgão do governo Lula fez novos pedidos.

Além de rejeitar demolições enquanto todos os moradores não estiverem em novas casas, a SPU também pede moradia gratuita para os mais vulneráveis e aumento nos valores financiados para famílias com quatro pessoas ou mais.

Em resposta, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação do Estado de São Paulo diz estar trabalhando com valores e condições de financiamento permitidas pela legislação estadual.

Apontando que as condições acordadas eram de conhecimento público, pois foram publicadas em edital, a secretaria ainda destaca que assumirá cerca de 70% do custo dos imóveis nos casos de famílias reassentadas cuja renda é de um salário mínimo -R$ 1.518, em valor atual.

Em nota enviada à Folha, a gestão Tarcísio também sugere a participação do governo Lula no custeio das unidades.

"Não há qualquer impedimento para que a União aporte recursos complementares para melhorar a situação das famílias que hoje vivem em precariedade extrema e alto risco, seja para aumento no valor a ser pago para os imóveis ou para pagamento de subsídios adicionais aos que a CDHU já oferece", diz a nota.

O governo estadual afirma ainda que "o apoio se justificaria pelo fato de a União ser interessada e beneficiária direta, uma vez que é proprietária da área em que se permitiu formar uma comunidade nesse nível de precariedade".



A CDHU tem reafirmado uma adesão voluntária de moradores à sua proposta de reassentamento que já beira os 90%. O dado é baseado na quantidade de famílias que entregaram documentação para ingressarem no programa habitacional em um cadastramento iniciado há aproximadamente oito meses.

Lideranças da Associação de Moradores da Favela do Moinho alegam, porém, que famílias estão sendo pressionadas a aderir.

Ao visitar casas na comunidade, sem a supervisão de líderes locais ou agentes do governo, a Folha ouviu de moradores que eles aceitaram o cadastro por temerem ficar sem alternativa após um eventual despejo.

O plano de reassentamento do governo paulista está vinculado à adesão dos moradores do Moinho às regras de financiamento habitacional da CDHU. Quem aceita recebe uma carta de crédito de R$ 250 mil para comprar um apartamento na região central da capital paulista. Caso o imóvel esteja em outra região ou mesmo fora do município, o valor da carta cai para R$ 200 mil.

A quantidade de imóveis disponíveis para mudança imediata na área central é baixa neste momento. São 108 unidades. Outras 392 estão em produção e 866 serão iniciadas, segundo os números mais recentes informados pelo Estado à União.

Para quem resolver esperar pela moradia definitiva, o governo oferece auxílio para aluguel no valor de R$ 800, sendo que metade da mensalidade será custeada pela prefeitura de Ricardo Nunes (MDB), aliado político de Tarcísio.

Na mais recente rodada de exigências, porém, a SPU pediu que as cartas de crédito tenham valores aumentados para R$ 250 mil, para moradias fora do centro, e R$ 300 mil, para imóveis na área central da capital.

Também há um pedido de aumento do auxílio temporário para moradia, que passaria a ser de R$ 1.200. Os acréscimos valeriam para famílias com quatro integrantes ou mais.

Alternativa utilizada em diversas áreas irregularmente ocupadas em São Paulo, a regularização não é uma alternativa atualmente debatida para o Moinho.

O risco oferecido às famílias e à operação dos trens urbanos, justamente pela localização da comunidade, tornam a urbanização inviável, segundo a gestão Tarcísio.

Gestão também aponta que local não oferece condições adequadas, com incêndios, disputas por posse, tráfico de drogas e a densa ocupação.

Folha de S.Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2025/04/uniao-desautoriza-demolicoes-e-pede-moradia-gratuita-para-familias-do-moinho-em-sp.shtml