George Soros, um personagem com história para muitos filmes

Figura marcante e presente em muitos movimentos da economia e da política em todos os continentes nas últimas décadas, o megainvestidor húngaro George Soros é hoje um ativo nonagenário que ainda causa muita polêmica.

Dono de uma fortuna estimada em US$ 8,6 bilhões pela revista Forbes, ele já foi retratado em filmes e reportagens que mostram sua trajetória de especulador financeiro ao redor do mundo, mas também um ativista judeu que sobreviveu ao Holocausto e, a partir de então, dedicou-se a combater o autoritarismo. Com o passar dos anos e envolvimento na política de muitos países, ganhou inimigos à direita e à esquerda.

Um dos filmes mais recentes que exploram sua trajetória é "Soros", lançado em 2019 nos Estados Unidos, e que foi exibido na 44° Mostra de Cinema de São Paulo - hoje é encontrado no streaming (Now) e para aluguel nas plataformas iTunes e Looke. O trabalho do diretor Jeff Dylan foi o de acompanhar o Soros em suas viagens pelo mundo, contando ao mesmo tempo sua história de superação que vem dos tempos da Segunda Guerra Mundial, quando já corria riscos ao se apresentar como um judeu disfarçado de cristão na Hungria ocupada pelos nazistas.

"O filme busca explicar as bases para o pensamento do bilionário como favorável ao que ele chama de 'sociedade aberta', algo que vai além dos princípios básicos da democracia. Ou seja, não basta haver eleições se os eleitos perseguem minorias", escreve o crítico Daniel Cury no site CinemAção.

"Mesmo se manifestando como um documentário que vai 'descobrir' o verdadeiro George Soros, o filme acaba por se autodeclarar uma defesa das ações do bilionário... no fim das contas, tenta mostrar que Soros é apenas um 'filantropo político', que faz escolhas baseadas em suas crenças, mas não tem poder sobre tudo", prossegue o crítico.



Jesse Dylan - Divulgação

Em crítica mais recente, publicada no jornal Valor, o autor Diego Viana taxa "Soros" como um filme que "não pode ser criticado por excesso de parcialidade. De partida é apresentado como apologia. Jesse Dylan, que conheceu o investidor e filantropo húngaro quando produzia documentários para sua Open Society Foundation, declara abertamente no material promocional que sua intenção é quase hagiográfica, consistindo em mostrar o 'nível gigantesco' do bem que Soros faz".

O crítico cita outras matérias para apontar as falhas de "Soros", lembrando quando o filme estreou em festivais internacionais e as opiniões apontaram justamente a pouca profundidade do olhar lançado sobre alguém com um passado tão rico e, aos 90 anos, uma atuação tão intensa.

O "New York Times" afirmou que, "mesmo como hagiografia, o documentário falha". No "Times of Israel", consta que "aprendemos mais na página Wikipédia de Soros do que no filme dedicado a ele". Ambas as críticas, e outras mais, "se queixam de que não aprendemos grande coisa sobre a intimidade do megainvestidor, seu modo de ser, as estratégias de negócios que o consagraram", conta Diego Viana.

A sequência do filme traz um exemplo que foge do tema sempre forte da política para entrar em outra seara: o dinheiro. A certa altura, revela o crítico do Valor, "vemos um trecho de uma entrevista concedida em 2004 ao canal americano C-Span. Perguntado sobre como é possuir dinheiro, Soros responde: "ele confere uma certa dose de liberdade e também uma certa dose de poder". É uma resposta franca, direta e lúcida, o suficiente para revelar a personalidade daquele homem".

E prossegue: "O que vemos na tela não é mesmo que os telespectadores da C-Span viram. A resposta completa tem três elementos. Segundo Soros, ser muito rico, em primeiro lugar, "é muito agradável, porque você não tem preocupações"; em seguida, confere liberdade e poder. O diretor Dylan não apenas cortou a referência ao prazer de ter dinheiro, como editou o som para eliminar o advérbio 'também' da passagem que fala da liberdade, já que precisa fazer parecer que esse era o primeiro elemento da resposta.

"Por que Dylan preferiu suprimir a constatação quase banal de que ter dinheiro remove preocupações? Talvez o diretor creia que a menção ao prazer e à tranquilidade trazidos pela riqueza possa ser mal recebida pelo público, por algum motivo. Mas em um assunto tão controverso quanto o dinheiro, um dos poucos consensos a unir quem tem a carteira recheada e quem vive à míngua é que, efetivamente, a afluência é prazerosa e tranquilizadora", conclui Diego Viana, que classifica o filme como "morno, anêmico e pouco corajoso. O oposto do corajoso bilionário húngaro".

Com esse currículo e uma vida ainda ativa no mundo dos negócios - mesmo com as limitações que a idade impõe -, George Soros é uma figura para ser discutida em muitas outras reportagens, teses universitárias, documentários e séries. Está claro que apenas um filme como "Soros" é pouco para avaliar a sua longa trajetória na política, na economia e na vida.