- Governo suspende licitação do projeto; previsão é de retomada em janeiro
- Riscos para concessionárias são proporcionais ao tamanho da aposta
O Governo de São Paulo vinha preparando um dos mais ambiciosos projetos urbanos do país: a PPP do Complexo Campos Elíseos, cujo investimento estimado era mais de R$ 6 bilhões e concebida para revitalizar uma área estratégica do centro da capital. A entrega das propostas estava marcada para 24 de novembro e o leilão para o dia 28. Mas, em 21 de novembro, a licitação foi suspensa -supostamente porque os potenciais participantes ainda estavam ambivalentes sobre assumir os riscos envolvidos no projeto. A indicação é de que o governo deve revisá-lo e republicá-lo em janeiro.
A magnitude da iniciativa explica tanto o entusiasmo inicial quanto a retirada dos interessados. Não se trata apenas da construção de um centro administrativo. O projeto inclui a desativação do terminal Princesa Isabel, a criação de um novo terminal no Bairro da Luz, a restauração integral de prédios tombados - entre eles o Palácio Campos Elíseos-, a implantação de um centro administrativo para cerca de 27 mil servidores, túneis subterrâneos conectando as edificações e um novo edifício-sede dos Correios. Tudo isso somado à completa revitalização do parque Princesa Isabel. É, na prática, uma ampla operação de renovação urbana em uma das regiões mais complexas da cidade.
Os riscos, porém, são proporcionais ao tamanho da aposta. O primeiro é o da desapropriação: o concessionário não recebe uma área contínua, mas um verdadeiro "queijo suíço", com ocupações irregulares, imóveis privados e famílias vulneráveis que precisarão ser realocadas. A DUP (Declaração de Utilidade Pública) a ser emitida pelo Estado apenas delimita os polígonos; toda a negociação, compra ou disputa judicial ficaria a cargo da concessionária. Há mitigantes em relação à diferença entre o custo dos imóveis estimado pelo governo e os custos efetivos a serem pagos pelo concessionário e, também, em relação à variação dos prazos judiciais. Esses são temas notoriamente fora do controle do concessionário e que precisam ser mitigados pelo sistema de reequilíbrio do contrato.
O segundo grande desafio é geotécnico. Parte significativa da região tem solos da Formação Resende, que se contraem e expandem conforme a umidade --um pesadelo para fundações profundas. Os edifícios previstos chegam ao lençol freático a partir do terceiro subsolo, exigindo rebaixamento e obras complexas em um ambiente densamente ocupado e com tráfego intenso.
Há ainda o risco de pagamento público. A garantia oferecida pelo Estado cobre de modo firme apenas metade do valor máximo da contraprestação --um ponto sensível em contratos de 30 anos que exigem desembolsos bilionários antes do início dos pagamentos.
Apesar dos desafios, o plano entregaria benefícios relevantes: maior eficiência administrativa, conservação permanente dos edifícios históricos e reanimação de uma área central que há décadas carece de intervenção estruturante e na qual toda a infraestrutura de energia, telecomunicações e saneamento já estão implantadas. Mas a retirada dos potenciais participantes revela que, tal como estava, o projeto não conseguia equilibrar ambição e viabilidade.
A suspensão abre uma rara oportunidade: ajustar o desenho, calibrar a distribuição de riscos e tornar o empreendimento financiável. Se isso for feito com transparência e técnica, Campos Elíseos poderá voltar da prancheta em janeiro e renascer como o projeto que São Paulo precisa.
Folha de S.Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/mauricio-portugal-ribeiro/2025/12/ppp-do-complexo-campos-eliseos-que-promete-transformar-o-centro-volta-a-prancheta.shtml





