Natália Portinari e Mariana Barbosa
A compra do então Banco Máxima, hoje Master, pelo banqueiro Daniel Vorcaro foi baseada em uma operação com indícios de fraude e superfaturamento, mostra documentação apresentada por ele ao Banco Central e obtida pelo UOL.
A aquisição foi financiada indiretamente por recursos de fundos de pensão de servidores públicos, com aportes desses em um fundo de investimentos, cujos gestores, ligados a Vorcaro, foram condenados por fraude.
Vorcaro e o Master foram procurados, mas não responderam até a publicação desta reportagem. Ele tem negado ter cometido irregularidades na gestão do Master.
Compra do Máxima
O BC avaliou a compra do Máxima ao longo do ano de 2018. Uma das condições para a aprovação era um aporte de R$ 50 milhões no banco por parte de Vorcaro.Para justificar a origem desse dinheiro, Vorcaro declarou uma receita operacional bruta de R$ 89 milhões no ano anterior da Viking Participações, sua empresa no setor imobiliário.
Parte dessa receita teria vindo da venda, por R$ 57 milhões, de um futuro condomínio de casas em Jequitibá (MG), município de 5.000 habitantes a duas horas ao norte de Belo Horizonte. O projeto se chamaria Jequitibá Village.

Foto do terreno em Jequitibá (MG), que a Viking vendeu por R$ 57 milhões, em 2017 Imagem: Google Earth

Imagem: Arte/UOL
Em setembro de 2017, no entanto, quando foi feita a transação, aquele era um terreno vazio, longe da promessa de um empreendimento imobiliário de luxo.
O terreno foi regularizado pouco antes, em 2015, quando as glebas foram avaliadas na matrícula por um valor total de R$ 2,5 milhões.
Em dois anos, a valorização do loteamento no papel -para justificar os repasses de R$ 57 milhões à Viking Participações-, portanto, foi de 2.180%, ou R$ 54,5 milhões.

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É um padrão que se repete em negociações imobiliárias relacionadas ao Master, que declarou também a valorização de 11.000% de um imóvel em 36 dias em Santa Cruz Cabrália (BA), como mostrou a revista piauí.
A PF tem investigações em andamento sobre como fundos imobiliários ligados ao Master, desde antes da aquisição por Vorcaro, inflavam o valor de seus ativos para conseguir respaldo para suas operações financeiras.
O UOL procurou o Banco Central e questionou quais foram as diligências realizadas, à época, para atestar a veracidade da operação apresentada por Vorcaro para justificar a compra do Máxima, mas não obteve resposta.

Imagem: Arte/UOL
O Fundo São Domingos, que, segundo o contrato, teria comprado o empreendimento de Vorcaro por R$ 57 milhões, foi criado em 2014.
Os dados públicos não permitem identificar os cotistas. Mas os ativos do fundo comprovam a relação entre Vorcaro e o antigo dono do Máxima, Saul Dutra Sabbá.
O antigo dono do Máxima, Saul Sabbá, foi denunciado pelo Ministério Público Federal, e depois condenado, como mostrou a Folha, por simular transações com fundos de investimento para inflar os balanços do banco e potencializar a captação de recursos.
Segundo a investigação, os balanços foram maquiados para ocultar prejuízos entre 2014 a 2016.
Depois que Vorcaro se torna dono do Máxima, as demonstrações financeiras enviadas à CVM pelos gestores do São Domingos passam a se referir ao Máxima Realty apenas como Realty.
O valor reportado para o ativo, no entanto, permanece igual: R$ 7,9 milhões.
O Residencial Jequitibá aparece na declaração de ativos do Fundo São Domingos com o valor de R$ 69,2 milhões em dezembro de 2018.
Isso significa que os R$ 57 milhões usados para capitalizar o Banco Máxima saíram, na realidade, de um fundo que tinha investimentos em negócios do próprio Vorcaro.
Esse fundo, segundo apontam as investigações, era controlado por pessoas ligadas ao banqueiro.
Vorcaro usou a venda do terreno superfaturado para demonstrar capacidade financeira para adquirir o banco Máxima.
O BC chegou a solicitar laudo para comprovação do valor do terreno -e acabou aprovando a operação de venda do banco em novembro de 2018.

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Fundos de pensão
O Fundo São Domingos foi abastecido por investimentos de fundos de pensão de servidores públicos. Em 2017, registrou um prejuízo de R$ 109 milhões, 60% de seu valor na época -o rombo está sendo investigado em inquéritos da Polícia Federal.Em 2022, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) condenou a Foco DTVM e o diretor do São Domingos, Sérgio Paulino Ferreira, a mais de R$ 1 milhão em multas por má gestão dos ativos, em parte por negócios com a família de Vorcaro.
Em 2016, por exemplo, o fundo fez uma permuta de R$ 50 milhões com a Milo Investimentos, empresa da família de Vorcaro.
A área técnica da CVM apontou que, nessa operação, houve supervalorização de um terreno em Aracaju.
Além disso, o Fundo São Domingos era administrado pela Foco DTVM, que, como mostrou o UOL, é investigada sob suspeita de ter causado prejuízo a fundos de pensão com operações que acabaram beneficiando as empresas familiares de Daniel Vorcaro.
A matrícula dos imóveis em Jequitibá está em nome da Mirante do Fidalgo Empreendimentos Imobiliários, de Aroldo Rodrigues da Silva, empresário de Sete Lagoas (MG) que tem um histórico de negócios em imóveis com Vorcaro.
Aroldo foi procurado, mas não respondeu ao contato do UOL. Os responsáveis pela administração da Foco DTVM e Fundo São Domingos também não retornaram.
Uol
https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2025/12/03/vorcaro-usou-terreno-superfaturado-e-fundos-de-pensao-para-comprar-o-master.htm





