Esquina das ruas Ministro Godói e Dr. Homem de Melo: ponto de encontro da turma de Perdizes - Vicente Vilardaga/Folhapress |
Turma do Barão tocava o terror em São Paulo nos anos 1970

Turma do Barão tocava o terror em São Paulo nos anos 1970

  • Gangue de classe média de Perdizes foi a mais famosa e violenta da cidade
  • Boa parte de seus membros era estudante do colégio Batista Brasileiro

Vicente Vilardaga

De 1970 a 1980 não havia bairro de classe média em São Paulo que não tivesse sua gangue, dedicada a arrumar brigas nas ruas e em festas para as quais seus integrantes não haviam sido convidados, depredar patrimônio público e privado e praticar bullying contra quem não fizesse parte do grupo.

A mais famosa delas foi a Turma do Barão, que se concentrava em frente aos edifícios Barão de Ladário e Barão de Laguna, em Perdizes, na esquina das ruas Ministro Godói e Doutor Homem de Melo.

Boa parte de seus membros era estudante do colégio Batista Brasileiro. Ela começou a se formar em 1973, como um time de futebol, e, aos poucos, conquistou dezenas de adeptos para praticar ações truculentas como forma de lazer.

Em seu estudo "Trajetórias Violentas e Origem Social dos Jovens: o Caso da Turma do Barão", de 2006, a socióloga Elisabeth Murilho da Silva mostra que a formação da gangue estava associada ao desejo de ampliar sua esfera de poder sobre o território que ocupava.

O principal instrumento que utilizava para defender e ampliar seu espaço de influência era a violência contra grupos rivais de outros bairros ou contra qualquer pessoa que não se afinasse com seu estilo de vida.

Eram jovens sem utopia e alienados, que pouco se importavam com a política e a ditadura, então em plena vigência. Num momento em que muitos estudantes estavam engajados na luta para mudar o sistema, os participantes da Turma do Barão só buscavam o conflito e não tinham perspectivas de futuro. Suas ações se baseavam no vazio da falta de ética e em laços perversos de solidariedade.

Nove pessoas sentadas e próximas umas das outras em ambiente externo, possivelmente em evento ou reunião social. A maioria veste roupas leves, como regatas e camisetas, e algumas seguram alimentos. Ao fundo, estruturas metálicas e outras pessoas em pé indicam local movimentado.
Membros da Turma do Barão em show dos Rolling Stones em 1995, quando a gangue estava extinta - Marcelo Soubhia/Folhapress

Para se divertir, costumavam depredar bares e restaurantes ou espancar inocentes impunemente. Se fossem presos, contavam com a conivência do pai de um dos membros, militar e ligado à Operação Bandeirante, centro de informações do 2º Exército, que ia às delegacias liberá-los.

A Turma do Barão aglutinava predominantemente homens, adolescentes e adultos jovens, e havia critérios de adesão ligados ao gosto musical, à iniciação nas drogas e ao destemor. Quanto mais inconsequente fosse o sujeito, mais prestígio tinha na gangue.

Também se media a disposição do novo integrante para defender seus colegas e sua lealdade aos princípios enviesados do grupo. Indivíduos que por qualquer motivo fossem considerados "fracos" estavam automaticamente excluídos. De um modo geral, se buscavam adeptos que fossem bons lutadores demonstrando destreza em capoeira e em outras artes marciais.

Edifício Barão de Ladário
Entrada do edifício Barão de Ladário: violência era forma de lazer de jovens de classe média - Vicente Vilardaga/Folhapress

O grupo se manteve coesa durante cerca de dez anos. Seu fim coincide com a abertura política e a perda das "costas quentes", mas também com a chegada à maturidade de alguns participantes e com o fim trágico de outros.

Embora a maioria dos 60 membros da Turma do Barão que eram chamados de "diretoria" tenha achado um rumo na vida, se tornado pequenos empresários, casado e tido filhos, estudos mostram que uma parte expressiva encontrou um fim trágico, morrendo vítimas da Aids, assassinatos, acidentes, suicídios ou sendo presos.

"O caso da Turma do Barão demonstra que as práticas de violência associadas às atividades lúdicas e de defesa do espaço eram comuns, inclusive, em bairros de classe média e alta da cidade nos anos 1970 e 1980", diz o sociólogo Renato Souza de Almeida no estudo "Juventude, Direito à Cidade e Cidadania Cultural na Periferia de São Paulo". A gangue de Perdizes tocava o terror para passar o tempo.

Folha de S.Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/blogs/andancas-na-metropole/2025/10/turma-do-barao-tocava-o-terror-em-sao-paulo-nos-anos-1970.shtml