Lula discursa na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, em 23 de setembro |
Lula, Gandhi e Mandela, por Aloizio Mercadante

Lula, Gandhi e Mandela, por Aloizio Mercadante

  • Em discurso histórico na ONU, presidente colocou Brasil na vanguarda contra autoritarismo
  • Brasil tem sido contraponto essencial em defesa da democracia, com instituições sólidas

Aloizio Mercadante
Presidente do BNDES. Foi ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República e ministro da Educação e da Ciência, Tecnologia e Inovação

Lula fez um discurso histórico na ONU, fortemente aplaudido e elogiado. Colocou o Brasil na vanguarda da luta contra o autoritarismo unilateral que Trump tenta impor ao planeta.

Lula emergiu como grande defensor de uma ordem mundial multilateralista, multipolar, pacífica e centrada no desenvolvimento social e ambiental. Também marcou princípios essenciais: soberania e democracia são inegociáveis.

Um pronunciamento necessário, especialmente no atual estágio de colapso da ordem global baseada na hegemonia do Ocidente.

A escalada do autoritarismo nos EUA e a ascensão da extrema direita no mundo têm nos levado a uma conjuntura preocupante, com elementos semelhantes aos das décadas de 1920 e de 1930, quando a crise econômica se combinou com o colapso de democracias, uma grande guerra e a dissolução da Liga das Nações.

Para além da economia e do comércio, as ameaças da ordem trumpista se estendem ao desenvolvimento sustentável, à paz, à multipolaridade, ao multilateralismo, à luta contra as desigualdades e, sobretudo, às democracias.

Felizmente, o Brasil tem sido contraponto essencial em defesa da democracia, com instituições sólidas, que asseguram o desejo popular expresso no voto. No dia 21, grandes mobilizações lideradas por artistas, intelectuais e o campo progressista reafirmaram a defesa dos valores republicanos e dos princípios democráticos.

É imperativa a geração de uma ordem mundial renovada, fundada nos valores da solução pacífica dos conflitos, do combate às assimetrias, do equilíbrio ambiental, da multipolaridade e de um multilateralismo efetivo. E que demanda lideranças legítimas e fortes, que não virão do Ocidente esfacelado, mas de um Sul Global articulado e unido.

A história nos dá exemplos de lideranças extraordinárias, do Sul Global, que ainda hoje inspiram o planeta. Somente indivíduos que combinam histórias de vida de superação e luta e a defesa intransigente de valores humanistas, iluministas, sociais e ambientais têm lugar no imaginário popular.

Gandhi e Mandela deixaram marcas indeléveis. Mesmo inicialmente contestados, reprimidos e aprisionados, se converteram em fonte de inspiração para o mundo.

Gandhi é até hoje modelo para quem luta por um planeta mais justo, inclusivo, sem opressão colonial, pela via da luta pacífica e não violenta.

Mandela, caracterizado como perigoso "terrorista" e que enfrentou 27 anos de prisão, se converteu num líder que inspira a humanidade em prol de uma ordem internacional não racista, anticolonialista, socialmente justa e aberta aos interesses legítimos de todos os países.

Lula também consolida um legado histórico e portador do futuro, pela construção dos Brics, a realização da COP30 no coração da amazônia, a organização do G20 e pelos avanços entre o Mercosul e a União Europeia, além do profundo compromisso com a paz, o diálogo, a inclusão social e o combate à fome.

Sustentado em sua experiência pessoal e em políticas bem-sucedidas, que possibilitaram a ascensão social de milhões de brasileiros, Lula levou uma mensagem crível e legítima de que outro mundo é possível. Pacífico, justo, sustentável e inclusivo. O Brasil de Lula poderá estar na liderança contra a barbárie unilateralista e antidemocrática que pesa contra o mundo.

Publicações internacionais, como The Economist e New York Times, afirmam, com razão, que o Brasil de Lula dá exemplo de maturidade democrática ao mundo, em contraste com os EUA de Trump, que agride princípios democráticos no plano interno e externo. O próprio presidente americano já admite negociar com Lula, um avanço importante na relação bilateral.

O jogo geopolítico, como disse Lula, não pode ser de soma zero, que seria a derrota do planeta e da humanidade. Quem aposta no negacionismo ambiental e sanitário, no ódio e nas assimetrias sairá derrotado.

Segundo Domenico De Masi, o Brasil é o único país do globo onde a cultura ainda mantém características de solidariedade, sensualidade, alegria e receptividade. O planeta merece o Brasil, e o mundo precisa de Lula.

Folha de S.Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2025/09/lula-gandhi-e-mandela.shtml