Lula atravessou os Andes para escorregar em casca de banana em Lima, por Luiz Carlos Azedo

Lula atravessou os Andes para escorregar em casca de banana em Lima, por Luiz Carlos Azedo

A Odebrecht operava uma rede de influência por meio de subornos e financiamentos ilícitos de campanhas, afetando partidos de diferentes espectros ideológicos no Peru

A ex-primeira-dama do Peru Nadine Heredia chegou a Brasília nesta quarta-feira em avião da Força Aérea Brasileira (FAB), graças a um salvo-conduto concedido pela presidente do Peru, Dina Boluarte, a pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A informação foi confirmada pela defesa do ex-presidente Ollanta Humala, marido de Nadine. O Ministério das Relações Exteriores informou à Embaixada do Brasil que a ex-primeira-dama foi condenada, pelo Poder Judiciário, a 15 anos de prisão por lavagem de dinheiro.

Detido pela polícia no final do julgamento, Humala está preso, mas Nadine não compareceu à audiência e pediu asilo na embaixada brasileira em Lima. Segundo o Ministério das Relações Exteriores do Peru, foi aplicada uma convenção sobre asilo diplomático firmada pelos dois países em 1954. A ex-primeira-dama chegou ao Brasil acompanhada de seu filho Samin Mallko Ollanta Humala Heredia, que é menor de idade.

"O Governo da República Federativa do Brasil solicitou a saída dos asilados, com base nos artigos V e XII da mencionada convenção, que estabelecem que o Estado que concede o asilo pode pedir a saída do asilado para território estrangeiro, e o Estado territorial está obrigado a fornecer imediatamente, salvo em caso de força maior, as garantias necessárias e o salvo-conduto correspondente", comunicou o Ministério das Relações Exteriores do Peru.

Com sua intervenção direta para obter o salvo-conduto e o envio de um jatinho da Força Aérea Brasileira (FAB) para resgatar a ex-primeira-dama em menos de 24 horas, Lula atravessou os Andes para escorregar numa casca de banana na calçada da Av. José Pardo, Miraflores, onde fica a embaixada brasileira.

Exumou um fantasma que ainda ronda o Palácio do Planalto: a memória da Operação Lava-Jato, que foi desconstruída juridicamente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mas permanece sendo uma bandeira nas mãos da oposição, que turva a liderança de Lula e a imagem da Corte perante a sociedade.

Humala e Nadine foram condenados após investigações segundo as quais o ex-presidente recebera US$ 3 milhões da Odebrecht e outros US$ 200 mil do então presidente da Venezuela, Hugo Chávez, para financiar suas campanhas presidenciais de 2006 e 2011. Além da pena de prisão, Humala terá de pagar uma multa de 10 milhões de soles (cerca de R$ 15,7 milhões).

Eleito presidente em 2011, Humala presidiu o Peru até 2016. Em 2017, ele e a mulher foram presos, porque o ex-diretor da Odebrecht no Peru afirmou que a empresa fez doações a Humala a pedido do PT. Nadine foi acusada de atuar ativamente nas atividades do Partido Nacionalista Peruano, fundado por Humala, e de participar na arrecadação de fundos e ações de governo. O irmão de Nadine, Ilán Heredia, cunhado de Humala, também foi condenado a 12 anos de prisão no mesmo processo.

Corrupção sistêmica


Humala venceu a eleição de 2011 ao derrotar Keiko Fujimori, filha do ex-presidente Alberto Fujimori. Keiko também chegou a ser presa por mais de um ano em um processo ligado à Odebrecht, posteriormente anulado pela Justiça. Outros três presidentes do Peru foram denunciados: Alan García, Alejandro Toledo e Pedro Pablo Kuczynski.

Em fevereiro passado, Humala negou ter recebido propina da construtora e sugeriu que o dinheiro poderia ter sido desviado pelo ex-diretor da empresa no Peru, Jorge Barata. "Não acredito que isso tenha acontecido, mas, se aconteceu, Barata roubou o dinheiro", disse, durante o julgamento.

A decisão da Justiça peruana também pôs uma saia justa no Supremo Tribunal Federal (STF), que anulou quase todas as condenações com base nas investigações da Lava-Jato, por abuso de autoridade e parcialidade dos procuradores e juízes que as conduziram, entre os quais o atual senador Sergio Moro (União-PR). O escândalo da Odebrecht no Peru, parte da Operação Lava-Jato, revelou um esquema de corrupção que envolveu subornos a autoridades peruanas.

Desde 2016, diversos ex-presidentes, partidos e empresários foram implicados, tornando-se um dos maiores escândalos políticos da história recente do país. Em outubro de 2024, o ex-presidente Alejandro Toledo foi condenado a 20 anos e seis meses de prisão por receber US$ 35 milhões em subornos da Odebrecht para favorecer a empresa na concessão de trechos da Rodovia Interoceânica.

Toledo foi extraditado dos EUA em 2023 e cumpre pena no presídio de Barbadillo. Alan García cometeu suicídio em 2019 ao ser alvo de mandado de prisão. Pedro Pablo Kuczynski renunciou em 2018 e aguarda julgamento em prisão domiciliar por acusações de corrupção. O escândalo abalou profundamente a política peruana, revelando um padrão sistêmico de corrupção que envolveu quase todos os presidentes desde 2001.

A Odebrecht operava uma rede de influência por meio de subornos e financiamentos ilícitos de campanhas, afetando partidos de diferentes espectros ideológicos. Em fevereiro de 2019, firmou um acordo de colaboração com o Ministério Público do Peru, que incluiu o acesso aos sistemas My Web Day e Drousys, que continham registros de pagamentos ilícitos. Em dezembro de 2024, o Tribunal Constitucional ordenou a divulgação do conteúdo do acordo.

Correio Braziliense
https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/lula-atravessou-os-andes-para-escorregar-em-casca-de-banana-em-lima/