Tanure: "Quando uma major perde interesse em um campo, não é porque ele não tem óleo, mas por uma lógica econômica. Ao assumirmos, trazemos eficiência" (./Divulgação) |
'Produzimos mais com menos', diz Nelson Queiroz Tanure, fundador da Prio

'Produzimos mais com menos', diz Nelson Queiroz Tanure, fundador da Prio

Empresário fala sobre a estratégia que levou a empresa a ser uma das queridinhas da bolsa e revela seus planos de expansão aqui e nos EUA

A história do setor petroleiro privado no Brasil é marcada por fracassos operacionais e escândalos. Em um quadro dominado pela estatal Petrobras e pelas IOCs (International Oil Companies), também conhecidas como majors, aquele roteiro gerou aversão nos investidores e fez parecer impossível o capital nacional privado extrair óleo, em mar ou terra, com lucro. Nos últimos dez anos, outra página passou a ser escrita, mas o novo enredo partiu de uma inédita abordagem sobre o negócio. "Às vezes, o melhor momento é o pior momento", define Nelson Queiroz Tanure, o fundador e chairman da Prio, a petroleira privada nascida em 2015, no auge da crise do petrolão. Com investimento inicial de 130 milhões de dólares, a companhia agora é dona de seis campos em operação na costa brasileira e deve fazer em breve a sua primeira perfuração internacional, nos Estados Unidos. Faturou 2,6 bilhões de dólares em 2023 e lucrou 1,1 bilhão. Está avaliada em 6 bilhões de dólares. "Nosso negócio é comprar as operações que não interessam mais para as majors, mas que para nós são grandes", diz Tanure. Aos 39 anos, com nome e sobrenome que nos últimos anos pautaram o capitalismo brasileiro pelas mãos do pai, o empresário Nelson Tanure, o jovem capitão do petróleo detalhou o modelo de atuação da Prio nesta entrevista a VEJA NEGÓCIOS.

A Prio se tornou uma das "queridinhas" da bolsa nos últimos anos. Como a empresa lida com isso? Aqui dentro há um equilíbrio entre escutar os investidores, ter uma comunicação transparente e manter uma visão de longo prazo. A depender do investidor, o foco dele é o curto prazo e, depois do ganho, vende o papel. Não entramos nessa onda. Tocamos a companhia como se fosse de capital fechado, uma empresa de dono. Por outro lado, é ótimo o mercado ter uma visão positiva sobre a Prio. O mercado é um grande parceiro para o nosso desenvolvimento.

Qual é o modelo de negócios da Prio? Nós compramos campos de petróleo na costa brasileira que já foram iniciados e desenvolvidos pelas grandes do setor, como BP, Shell, Total e outras. Ao assumir, praticamos nossos métodos de eficiência operacional e expansão de produção com segurança, sustentabilidade e custos reduzidos. Nunca somos, nem seremos, os primeiros a perfurar.

Por quê? Os poços de petróleo têm um dono ideal ao longo de sua fase produtiva. No primeiro momento, de exploração e desenvolvimento, esse lugar cabe às majors, em razão da grande exigência de capital. Em seguida, quando aquele poço não é mais atraente para as grandes, as independentes, como nós, procuram assumir a posição. Não vamos mexer nesse modelo.

A primeira compra, em 2015, foi a do Campo de Polvo, que pertencia à britânica BP. Como foi o negócio? Eu trabalhava no fundo Docas, do meu pai, e estávamos numa safra de investimentos. Olhamos o cenário brasileiro e vimos que havia oportunidade para uma empresa independente. Já havíamos estudado casos de sucesso no Mar do Norte, no Golfo do México e na África. O setor, naquele período, estava desacreditado no Brasil, em razão de uma fase de euforia que terminou em grande frustração.

"Nunca seremos os primeiros a desbravar uma região e fazer uma descoberta. Deixamos isso para as grandes do setor"

Qual é a sua leitura daquele período? O que aconteceu no Brasil, entre 2010 e 2015, foi muita euforia do lado errado do negócio. As empresas do Eike Batista (OGX), do Marcio Mello (HRT) e do Roberto Viana (Petra Energia) quiseram começar um jogo grande, desde a primeira fase do negócio, mas esse jogo é só para os gigantes. Quando você comete um erro, a conta é enorme, não vai aguentar. Só quem suporta são as grandes. Nós observamos que o problema era de estratégia, porque o espaço para operar existia.

O que foi feito para entrar no setor? Oferecemos 130 milhões de dólares por 60% que a BP detinha do Campo de Polvo, no Rio. Mostramos nossos planos a eles, que toparam vender. O interesse da grande é sempre o de transferir a operação para uma empresa confiável, porque, se essa nova empresa não operar bem, o regulador, que é a Agência Nacional de Petróleo, chama a vendedora de volta para resolver os problemas. Herdamos a dinamarquesa Maersk como sócia em 40% de Polvo. Logo que assumimos, a Maersk nos desincentivou, dizendo que possuíam estudos que apontavam para um prejuízo iminente de 100 milhões de dólares. Mostramos como queríamos recuperar o campo, mas eles não se convenceram. Perguntamos, então, quanto nos pagariam para ficarmos com a parte deles, já que previam perdas. Negociamos e recebemos 34 milhões de dólares. O regulador estava acompanhando tudo e nos pediu uma garantia para o caso de a operação fracassar. A ANP exigiu 34 milhões de dólares, fizemos o depósito e passamos a deter 100% do negócio.

Foi uma boa compra? Polvo tornou-se a base para o crescimento da companhia, mas o início foi difícil. O petróleo estava cotado por volta de 90 dólares o barril e nosso custo de produção, em mais de 80 dólares. A margem era pequena. Negociamos uma série de contratos para cortar custos, mas ainda assim estávamos produzindo só 6 000 barris diários, com tendência declinante. Com o tempo, a produção melhorou, os preços subiram e partimos para novas aquisições.

A empresa cresceu muito por meio de aquisições de novos campos, certo? Nesses dez anos, dissemos muito mais não do que sim para aquisições. Sabemos perfeitamente o que queremos. Estamos formando clusters na Bacia de Campos, buscando ter campos próximos para haver integração operacional e, portanto, economia de custos. Depois de Polvo, compramos um campo de gás e, em seguida, ficamos com o Campo de Frade, da Chevron, que havia tido um problema grande de vazamento. Estudamos muito o que deu errado para eles. Àquela altura, Frade produzia 20 000 barris por dia e ampliamos para 55 000 barris. Ninguém acreditava, mas realizamos. Depois, compramos o que sobrou da empresa do Eike e mais um campo particular. Também ficamos com a HRT, que ainda tinha algum capital. Da Petrobras, compramos o Campo de Albacora Leste. No ano passado, adquirimos o Campo de Peregrino, ao lado de Polvo, dos chineses da Sinochem, por 2 bilhões de dólares.

Qual é a estratégia para cortar custos e aumentar a produção de campos que já foram explorados? Quando uma major perde interesse em um campo, não é porque ele não tem mais óleo, mas por uma lógica econômica dela. Ao assumirmos, perfuramos novos poços, negociamos com fornecedores, trazemos eficiência. Também ajustamos as compras de insumos. Nosso pessoal põe a mão na massa e tem agilidade. Quando você é menor, cuida mais rápido. No petróleo, tempo é dinheiro. Uma bomba consertada rapidamente dá diferença na quantidade de barris extraídos. A independente faz isso melhor que a major.

Como está a relação entre custos de produção da Prio e preços do petróleo no mercado? Na média, em nossos seis campos, trabalhamos com um custo de produção de 11 dólares por barril. Isso se dá em um cenário de preços por volta de 75 dólares por barril. Não precisamos de capital novo, portanto. Temos reservas. Mesmo que o preço do óleo caia, ainda teremos bastante segurança.

"Meu pai me deu a oportunidade de crescer entre o Brasil e os EUA, e isso marcou a minha formação como empresário"

A companhia também comprou o Campo de Wahoo, no Espírito Santo, mas não recebeu autorização do Ibama para a exploração. É a lenga-lenga a que se referiu o presidente Lula? Não vou entrar nesse pormenor, mas o fato é que o Ibama entrou em greve. Isso travou tudo. A autorização já deveria ter sido dada no ano passado. Começamos o ano produzindo mais de 100 000 barris de óleo diariamente, e com Wahoo liberado poderemos aumentar essa marca em até 50% ainda em 2025.

Como estão os planos para explorar petróleo nos Estados Unidos? Os Estados Unidos têm uma oportunidade muito parecida com a que aproveitamos aqui no Brasil. Dos 13 milhões de barris que eles produzem diariamente, apenas 3 milhões saem do mar. A nossa operação, que é exclusivamente no mar, combina com essa situação.

A exploração da Margem Equatorial atrai a Prio? Lá tem muito petróleo, mas nós nunca seremos os primeiros a desbravar uma região nova e fazer uma grande descoberta. Deixamos isso para as grandes. Nós queremos nos manter como coadjuvantes. Não temos nenhum interesse na Margem Equatorial.

Há intenção de diversificar a produção para fontes de energia mais limpas? Não temos essa intenção e acreditamos, sim, que petróleo e sustentabilidade andam de mãos dadas. A pegada de carbono direta de um campo de petróleo é baixinha. A da Prio é da ordem de 18 quilos de CO2 equivalente por barril. Antes de comprarmos nossos campos, era de 31 quilos. Fazemos a nossa parte. Há muito desconhecimento sobre a produção de energia. Existe muito desperdício na geração da energia solar e da eólica. A energia mais limpa é a nuclear, mas o petróleo está aqui até hoje porque é a fonte mais barata.

Qual é o papel de seu pai em sua formação como empresário? Ele é um mestre para mim. Cresci numa casa de negócios. Tenho fascínio por todos os tipos de negócios, gosto de estudá-los. Meu pai me deu a oportunidade de crescer entre o Brasil e os Estados Unidos, e isso marcou a minha formação como empresário. Sou muito grato a ele.

Publicado em VEJA, fevereiro de 2025, edição VEJA Negócios nº 11
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